Por Ricardo Guerra para o Saker Latinoamérica
Em termos práticos, o conflito entre a Rússia e a Ucrânia gerou um impacto imediato na alta dos preços do petróleo e seus derivados, além de uma pressão sobre o já crescente processo inflacionário no Brasil.
O alto preço da gasolina local, devido a absurda política de paridade de preço internacional adotada pela Petrobras, tenderá a subir ainda muito mais e o preço dos derivados – e de toda a cadeia produtiva que depende desses produtos (principalmente a cadeia alimentar) – afetará sobremaneira a vida (já tão difícil) do cidadão brasileiro:
- A questão dos fertilizantes – cujo volume total importado pelo Brasil da Rússia fica em torno de 25% da necessidade do país, agrava essa situação;
- E as sanções impostas pelas grandes potências à Rússia ainda podem inviabilizar ou impedir, entre outras coisas, que o Brasil realize negócios direto com o governo ou empresas russas, como, por exemplo, na atuação como intermediário de navios e embarcações russas na América do Sul;
- Em resumo, como sempre acontece, os prejuízos econômicos das ações implementadas pelo imperialismo, vão ser repassados para o consumidor a curto, médio e longo prazo.
No que se refere aos aspectos políticos, apesar do Brasil não ter qualquer posição de relevância em relação ao conflito, pelo fato do país ter assumido um assento não-permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas no início deste ano – a depender da posição que tomar nas discussões nesse Conselho poderá (ou não) afetar ainda mais a situação no país.
No entanto, o aspecto mais importante que não podemos deixar de observar nessa análise, é que – sob os auspícios da guerra – o imperialismo tenderá a apertar ainda mais o cerco sobre a América Latina, principalmente aumentando o controle sobre o Brasil: o maior e mais rico país da região.
Por um lado, o império seguirá manipulando e dirigindo a configuração dos atores que participam direta e indiretamente dos processos eleitorais com o objetivo de impor um governo com uma roupagem “menos tosca”, mas que valide e amplie todas as armações entreguistas anteriormente feitas:
- Dando continuidade a total destruição da soberania nacional;
- E avançando contra os parcos direitos sociais (duramente conquistados pelo povo brasileiro) que ainda possam existir.
Nesse contexto, a aliança entre o PT e o PSB, colocando – lado a lado – opositores históricos como Lula e Alckmin, representa a concretização do “mais perfeito cenário político”:
- Garantindo, em qualquer situação, a eleição de um candidato favorável ou – pelo menos – cerceado o bastante e suficientemente pressionado para satisfazer os interesses imperialistas;
- Ainda mais, com uma conjuntura totalmente organizada para favorecer a composição dos parlamentos (em nível local, regional e nacional) majoritariamente formados por representantes da direita e da extrema direita.
A visita de Victoria Nuland ao Brasil, ocorre exatamente neste sentido e revela uma forte pressão por garantias de recursos para a continuidade do esforço de guerra do imperialismo em busca da continuidade do controle total do mercado mundial – envolvendo, entre outros:
- Acertos quanto a aceleração da entrega do setor energético (Eletrobrás/Petrobrás) e demais importantes empresas e recursos nacionais;
- E “um basta” a qualquer possibilidade de acordos e negócios entre o Brasil e a Rússia, principalmente no que se refere aos aspectos relacionados ao desenvolvimento do submarino nuclear e outras áreas estratégicas para o Brasil – o que, de imediato, determinou o cancelamento da recentemente anunciada venda de um grande projeto de fábrica de fertilizantes da Petrobras a uma empresa Russa.
Por outro lado, como o aumento da agressividade imperialista impõe fortes efeitos colaterais, como a aceleração da inflação, o aumento do custo de vida e a desestabilização social e política generalizada:
- Há uma tendência das massas se colocarem em movimento (reagindo);
- O que, consequentemente, levará o imperialismo a intensificar o aperto no regime político contra as massas e os trabalhadores.
Nesse sentido, é muito provável que ocorra um avanço ainda maior (no Brasil e região) da criação de leis mais autoritárias e arbitrárias, ampliando-se as condições para o controle total da vida dos cidadãos e o aumento das possibilidades do governo monitorar, perseguir e punir qualquer um que seja contra seus interesses e ideologia, ou seja, contra os interesses e a ideologia do imperialismo.
Por fim, para justificar e naturalizar tudo isso, a mídia vai intensificando suas narrativas para promover a ideologia neoliberal e legitimar a imposição do individualismo como projeto de vida e política de governo:
- Fazendo o serviço sujo de demonizar o Estado e a necessária força que precisa ter para exercer o papel de provedor do bem-estar social e garantidor dos direitos sociais;
- Ao mesmo tempo em que caracteriza e exalta o “mercado” como o redentor das mazelas da sociedade, onde o sucesso ou a falha da economia são atribuídos exclusivamente aos esforços do indivíduo.
Dessa forma, o esforço de guerra do império avança não apenas sobre os países da periferia do capitalismo e sobre aqueles que desafiam o seu poder (em trajetória decadente), mas sorrateiramente sobre nossas mentes.
Ricardo Guerra é cronista anti-imperialista. Articulista da Gazeta Revolucionária e Primera Línea Revolucionária América Latina.
Be First to Comment