Por Alejandro Acosta e Ricardo Guerra para o Saker Latinoamérica e PLR – 15 de junho de 2022
Com a fusão entre o capital industrial e o capital bancário – um processo que começou a se configurar ainda no final do século XIX – o imperialismo foi transferindo e aumentando o repasse da crescente crise capitalista para os países que se situam às margens do centro do capitalismo mundial.
A imposição da agenda neoliberal é uma “decorrência natural” desse processo:
- Sendo a principal estratégia adotada pelo imperialismo, destacadamente a partir da década de 1970;
- Para contemplar o seu agudo objetivo de sufocar e impedir o desenvolvimento autônomo dos países do capitalismo periférico – inseridos tardiamente, e de forma dependente, no sistema do capitalismo.
É a “fórmula” recorrida pelos grandes capitalistas para resolver a queda da taxa de lucros no contexto da maior crise capitalista da história mundial:
- Fomentando a geração dos insaciáveis lucros para as empresas dos países capitalistas centrais;
- Ao custo da precarização do trabalho e da exploração dos trabalhadores – e a subtração do patrimônio público, financeiro e estatal na periferia do sistema;
- Mantendo, assim, os países que a integram como meros fornecedores de matérias primas.
Dessa forma, a agenda neoliberal – essa maliciosa operação geopolítica arquitetada pelo imperialismo – tem por objetivo saquear recursos indispensáveis à vida das pessoas nos países a ela submetidos:
- Violando a soberania desses países;
- Sufocando suas economias, eliminando direitos e destruindo todas as formas de ação orientadas para o bem-estar social das populações locais (ver aqui, aqui e aqui).
Uma agenda pensada para manter a criação dos volumes de capitais especulativos (que se converteram em componentes fundamentais para o funcionamento do capitalismo contemporâneo) em perspectivas indefinidas – e promover a acumulação de lucros (fictícios e apocalípticos) para os super grandes capitalistas.
Entre outras coisas:
- Forçando a redução dos gastos do Estado em serviços essenciais como saúde, educação e infraestrutura;
- E pressionando a entrega das empresas estatais (das nações subjugadas) ao capital transnacional.
Nesse contexto, os termos “desnacionalização da economia” e “privatização” são usados – pelos agentes a serviço do imperialismo (ver também aqui e aqui) – para tentar disfarçar a falácia que representa a “venda” (na verdade, a desavergonhada entrega) das empresas estratégicas de um Estado Nação, submetido aos ataques imperialistas, com a implantação dessa famigerada agenda.
As privatizações deixam milhares de famílias sem sustento, entregando a preço irrisório empresas públicas super lucrativas:
- Com potencial de promover o desenvolvimento de uma pujante cadeia produtiva para os países;
- E a capacidade de gerar receitas que podem ser utilizadas pelos governos locais em investimentos em infraestrutura e bens e serviços fundamentais para a sua população.
Os Correios, por exemplo, geraram ao Brasil mais de R$ 12 bilhões de lucro nos últimos 20 anos (em 2020 esse lucro foi R$ 1,5 bilhão) e aproximadamente 75% desse lucro foi repassado diretamente aos cofres do governo:
- A empresa ainda tem um mercado altamente promissor a ser explorado, com a perspectiva de entrar na lucrativa fatia do mercado de vendas online;
- Mas, infelizmente, a expectativa é que a maior infraestrutura logística do Brasil seja entregue pelo equivalente a alguns anos de lucros – e o controle dos Correios passe às grandes empresas do setor, como FedeX, UPS e DHL, tendo a Amazon e até a Magazine Luiza demonstrado interesse na compra da estatal.
A privatização da Ceitec, em plena corrida tecnológica para a Indústria 4.0:
- Extingue a nossa mais importante estatal voltada à inovação de ponta e produção de chips;
- E reafirma a lamentável opção do atual governo de relegar o Brasil à triste condição de um país colônia, submisso e apenas exportador de matérias primas.
A venda do Serpro pode dar a seu controlador poder excessivo de competição no mercado:
- Gerando diversas vantagens indevidas;
- Além de colocar em risco os dados dos brasileiros.
E a Petrobrás, que está sendo completamente esquartejada por governos entreguistas e subservientes aos interesses do capital transnacional – nos últimos anos:
- Está perdendo a sua capacidade de movimentar uma ampla cadeia produtiva para impulsionar o desenvolvimento do Brasil;
- E, apesar dos seus investimentos terem conduzido a maior descoberta de petróleo dos últimos 50 anos em todo mundo, sua privatização está comprometendo até a segurança do abastecimento nacional de combustíveis com preços justos;
- O que afeta individualmente as pessoas, como também a economia e o desenvolvimento do país – o preço da gasolina subiu mais de 50% no ano de 2021 e, apenas nos primeiros 4 meses de 2022, já houve uma elevação de mais de 22% no valor dos combustíveis, e o abastecimento já corresponde a 41% do gasto dos brasileiros com carro.
Falando ainda especificamente sobre a Petrobrás, os campos de petróleo estão sendo entregues por algo em torno a 5% do valor de mercado, e ainda sem licitação – ação que nem sequer Fernando Henrique Cardoso (o príncipe da privataria), nos seus dois governos ultra entreguistas, ousou fazer:
- As refinarias, o setor de transporte, e todas as operações do Nordeste foram entregues por preços irrisórios;
- E hoje, o número de seus empregados concursados corresponde a cerca de 30 mil, o equivalente apenas a 8% do total de trabalhadores da empresa.
A sanha privatista é tão grande – que até mesmo o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal estão sob a mira dos entreguistas:
- Mesmo, as duas instituições financeiras, sendo fundamentais bancos públicos para os interesses do país e não estabelecendo nenhuma relação de competição com os bancos privados – visto que atuam em nichos de mercados distintos;
- O Banco do Brasil é essencial para a operação de crédito agrícola, tanto para os pequenos produtores nacionais, como para as gigantes empresas do agronegócio;
- E a Caixa Econômica Federal, a principal instituição fomentadora de crédito imobiliário para a população de baixa renda.
Até o SUS (Sistema Único de Saúde), do qual 70% da população brasileira depende exclusivamente dos serviços, não ficou fora dessa investida:
- E se nada for feito, o Sistema que é um dos modelos mais abrangentes e eficientes de atendimento público à saúde no planeta, provavelmente não sobreviverá ao desmanche ao qual está sendo submetido;
- Visando favorecer os interesses das corporações privadas – vinculadas ao grande capital transnacional.
A recente “privatização” da Eletrobras, que representa o mais escabroso escândalo de entreguismo no Brasil desde a vergonhosa “venda” da Vale do Rio Doce:
- Significa abrir mão de uma das empresas mais lucrativas do país;
- Entregando ao capital estrangeiro décadas de pesquisa e produção tecnológica que poderiam colocar o nosso país na vanguarda da transição energética;
- E aumentará o risco de apagão e aprofundamento da crise econômica – além de que, fatalmente fará elevar o valor das contas de luz.
Estima-se que o governo brasileiro tenha investido em torno de R$ 500 bilhões no setor elétrico:
- Mas, a gigante estatal (maior empresa de energia elétrica da América Latina), fundamental para a nossa soberania energética;
- Foi “negociada” na bolsa brasileira pelo insignificante valor de pouco menos de R$ 35 bilhões.
Esse processo promoveu a entrega de mais de 165 centrais hidrelétricas do país – “vendidas” por ⅓ do valor apenas da Usina de Belo Monte, cujo principal objetivo de sua construção, atendendo aos interesses do imperialismo;
- Foi abrir o Amazonas para a produção barata de minerais (como o minério de ferro, ouro e níquel) para ser entregue às corporações transnacionais.
- Ou seja, custeada pelo Estado brasileiro, a energia elétrica na região passou a ser viável e barata para ser utilizada na produção privada dos grupos dos grandes monopólios internacionais – produção que terá como destino a especulação financeira nas bolsas de mercadorias e futuros de commodities (matérias primas), sem oferecer qualquer benefício para o Brasil.
Além disso:
- Com risco zero e altos lucros garantidos, esses mesmos grupos ainda receberam a benesse do governo brasileiro para ficar com o filão do fornecimento de turbinas e equipamentos de alta tecnologia;
- E, ainda, a oportunidade de serem recrutados como prestadores de serviços no consórcio da EletroNorte.
Enfim, não podemos deixar de ter a clareza de que a questão das privatizações é muito mais do que uma simples questão de visão ideológica:
- Representa um problema de Estado;
- E é uma real questão de segurança nacional.
Acrescido aos exemplos anteriores, encontra-se o vergonhoso caso da entrega da Base de Alcântara aos EUA, que inviabiliza o projeto de desenvolvimento autônomo em área tão importante para o desenvolvimento tecnológico e econômico do nosso país: um escabroso crime de lesa-pátria.
Do jeito que as coisas estão caminhando até a soberania sobre o nosso território está sendo perdida:
- Com a recente aprovação da venda de terras nacionais para estrangeiros passando no Senado;
- Aprofundam-se os riscos não só em relação à capacidade de produção nacional de commodities – em prejuízo a performance das exportações por parte das empresas nacionais, ainda existentes;
- E agrava-se a questão da segurança alimentar e até física da nossa população.
Além de tudo que foi levantado até o momento, não podemos deixar de destacar o fato, de que:
- A qualidade dos serviços privatizados caem de forma tão absurda e o custo das tarifas praticadas pelas empresas doadas ao grande capital vão a patamares tão altos;
- Que inviabilizam o seu acesso para grande parte da população, tendo como triste exemplo, o aumento no Brasil do contingente de pessoas que passaram recentemente a usar lenha para cozinhar.
O descaso e desrespeito com a dignidade e a vida das pessoas é outro importante aspecto a ser observado nesse contexto.
Os problemas relacionados à privatização da Vale do Rio Doce, por exemplo, além das tragédias de Mariana e de Brumadinho – que nos remete à perversidade que é a lógica do grande capital de colocar o lucro acima de tudo e de todos – escancara a forma como agem os entreguistas nesse sentido:
- A avaliação do valor da empresa ficou restrita apenas ao fluxo de caixa existente naquele momento, não levando em conta as reservas de minério de ferro – segundo especialistas, suficientes para abastecer o mercado por mais de 400 anos;
- O recurso utilizado para a compra foi disponibilizado aos compradores pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) – a juros subsidiados;
- E a venda provocou a desnecessária demissão de milhares de trabalhadores da companhia – uma das mais lucrativas estatais brasileiras.
É assim que as denominadas classes dominantes do Brasil, desde sempre operam para garantir para si e para o capital transnacional acesso privilegiado aos nossos recursos e bens públicos, em detrimento dos mais pobres e vulneráveis – e o massacre segue avançando.
- Representando um resquício do passado colonial e escravista brasileiro, estão sempre dispostos a servir à metrópole estrangeira (dominante no momento), contra os interesses nacionais;
- Violando os direitos do povo brasileiro, pelo qual não detém empatia, nem qualquer sentido de pertencimento.
Forjados através de um meticuloso processo, que envolve infiltração e cooptação de membros dos poderes e instituições locais – e um ardiloso esquema de dominação cultural, manipulação de eleições, etc:
- Esse grupo (que tem como principal característica o viralatismo) é configurado por uma coalizão formada por políticos, militares, empresários, juristas e representantes de uma mídia vulgar e despudoradamente servil aos interesses imperialistas – denominadamente os quinta colunas brasileiros (ver também aqui);
- Desprovidos de qualquer traço de brio nacional ou civilizatório, representam os “negócios” do império a soldo por corretagem, pago com o suor e sangue do nosso povo – ou simplesmente por mera cooptação cultural, advinda de um processo de intensa colonização do pensamento, que lhes revestem de notória característica anti-povo e anti-nacionalista.
Infelizmente, no contexto do enfrentamento dessa calamitosa situação, muitos representantes da esquerda nacional há tempo deixaram a combatividade de lado e, na verdade, “somam-se” ao sujo e desprezível “trabalho” dos entreguistas:
- Visto que se preocupam apenas em cuidar dos interesses eleitorais;
- E atualmente fazem simplesmente uma oposição de fachada e dentro de parâmetros consentidos e ditados pelo imperialismo – essa “esquerda”, hoje é conhecida como a esquerda oficial, esquerda identitária ou simplesmente “ex-querda”.
Seus representantes, infiltrados nos sindicatos e movimentos sociais, dominam completamente espaços que no passado representavam a luta revolucionária e anti-imperialista e, na prática, atuam desavergonhadamente a serviço do massacre do Brasil:
- Constituem verdadeiras máfias que paralisaram a reação dos trabalhadores e do povo durante anos;
- Levando as pessoas a acreditarem que a “saída” para os ataques aos interesses populares, à causa dos trabalhadores e à soberania nacional estaria sempre nas próximas eleições (cada vez mais fraudulentas – ver aqui e aqui);
- Garantindo o objetivo das classes dominantes de continuar entregando integralmente o Brasil, ao mesmo tempo em que arrefecem o ânimo para a mobilização, a organização e a luta, num nítido esforço para evitar a insurgência do povo brasileiro – frente a essa situação de massacre.
- Nós, cidadãos brasileiros, continuamos sendo roubados e tendo saqueados o nosso patrimônio e os nossos direitos;
- E o sonho de construção de uma nação da qual todos possamos nos orgulhar, que priorize a justa distribuição da riqueza aqui produzida, vai ficando cada vez mais distante.
Os proprietários dos Correios, da Petrobrás, da Eletrobras, do Serpro, da Ceitec, dos Bancos públicos, do SUS e de todas as empresas estatais do Brasil são o povo brasileiro!
Lutar contra as privatizações, além de ser um ato de resistência, representa um movimento que simboliza perspectivas promissoras no processo de construção e viabilização de uma sociedade mais justa e com soberania para decidir quando, onde e como investir, visando (SEMPRE) a melhora da qualidade de vida e o bem-estar do nosso povo.
Alejandro Acosta é membro da Gazeta Revolucionária e Primera Línea Revolucionária América Latina. Diretor Geral de O Doleiro, a Primeira Série Brasileira para as Redes Sociais. Profundo conhecedor da realidade da América Latina e impulsionador da unidade dos verdadeiros revolucionários, anti-imperialistas e democratas.
Ricardo Guerra é cronista anti-imperialista. Articulista da Gazeta Revolucionária, da Primera Línea Revolucionária América Latina, da Rádio Expressa e da Rádio Revolução Latino-americana.
A Eletrobrás está sendo vendida por menos de 3% do seu valor, pois ninguém está falando de todo o regime de gestão hidrológica, de valor incalculável, que está indo de graça. O Brasil está a passos largos para a sua congolização.
Como bem demonstra o artigo, o Bolsonaro está fechando a fatura a la Menem. Sem qualquer oposição nas ruas. Nem repressão o governo está fazendo. Só o diversionismo midiático com participação da classe política e intelectual basta.
Certamente o Brasil vive o pior momento político desde o início da sua existência.
O caso da desindustrialização da Ucrânia já deveria deixar qualquer um assuntado no tema com o cabelo em pé.
Retornaremos ao século XIX pelo menos.
Ai, independente do capacho ianque travestido de presidente que entrar, só vai atuar reprimindo o povo, não haverá outra alternativa.