O Saker entrevista o professor Said Mohammad Marandi
21/8/2019, The Vineyard of the Saker (para Unz Review)
Introdução: Primeiro, vários amigos sugeriram recentemente que eu entrevistasse o Professor Said Mohammad Marandi; depois li esse texto interessantíssimo no blog Moon of Alabama e decidi pedir ao Professor Marandi que partilhasse conosco suas ideias sobre a atual situação no Irã, no Golfo Persa e no resto do Oriente Médio. E o professor aceitou responder minhas perguntas, apesar de sua agenda tão ocupada. Sou extremamente grato ao Prof. Marandi pelo tempo que nos dedicou e por suas respostas.
Crucialmente importante, o Prof. Marandi desmente completamente a ideia estúpida segundo a qual Rússia e Israel seriam aliados ou trabalhariam juntos. Também desmente outro boato sobre grandes diferenças que haveria entre Rússia e Irã, sobre a Síria.
O Prof. Marandi, que está atualmente no Irã, tem contatos extraordinariamente bem qualificados; espero que com essa entrevista alguns dos mais disseminados boatos postos recentemente em circulação sejam afinal reduzidos de volta ao que sempre foram: absoluto, total, nonsense. Aproveitem a entrevista!
[assina] The Saker
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The Saker: Fala-se muito de um “Eixo da Resistência”, que incluiria Síria, Hezbollah, Irã, Rússia e China. Às vezes, também são incluídos nessas listas os estados de Venezuela, Cuba ou a República Popular Democrática da Coreia, RPDC (“Coreia do Norte”). O senhor acredita que exista esse “Eixo da Resistência”? E caso acredite, como o senhor caracteriza a natureza dessa aliança informal? O senhor acha que essa aliança informal pode vir a crescer e tornar-se aliança política ou militar formal, ou algum tratado de segurança coletiva?
Professor Marandi: Acredito firmemente que, sim, há um Eixo da Resistência que, hoje, inclui realmente Irã, Síria, Iraque, Gaza, Líbano, partes do Afeganistão, e Iêmen. Não acho que se possa incluir, seja pela via que for, a RPDC. Creio que a Rússia possa ser considerada até certo ponto como alinhada ou afiliada a essa Resistência, mas bem poucos sentirão a necessidade de reconhecer essa realidade. Em certos níveis, há ampla superposição de políticas russas e chinesas e de políticas dos países e movimentos nessa região afiliados a esse Eixo da Resistência. O mesmo vale para Venezuela, Bolívia e Cuba – países que absolutamente não considero semelhantes à Coreia do Norte.
Como em praticamente todos os pontos do planeta, a política dos EUA na Coreia do Norte é feia, hegemonista e de má-fé. Mas a natureza do governo da RPDC é fundamentalmente diferente do que são Venezuela ou Cuba, gostem os norte-americanos e europeus de reconhecer essa evidência, ou não. Outros interpretam o Eixo da Resistência de modo a incluir ou excluir determinados países, mas é perfeitamente claro que Irã e Rússia têm objetivos políticos similares, no que tenha a ver com algumas questões chaves.
Apesar de tudo, a Rússia tem relação muito próxima com o regime israelense, o qual, para o Irã, é estado de apartheid, quase idêntico ao apartheid que marcou a África do Sul. E também, por exemplo, a posição do governo sírio em relação a Israel é diferente da posição do Irã.
A posição oficial do governo sírio é que Cisjordânia e Faixa de Gaza têm de ser devolvidas aos palestinos, em obediência a Resoluções do Conselho de Segurança da ONU; e que as colinas ocupadas do Golan têm de ser devolvidas ao povo sírio. Todas essas são demandas legítimas.
O Irã crê firmemente que Israel é regime colonial de apartheid, regime moralmente inaceitável na forma que tem hoje. Assim sendo, pelo menos oficialmente, há diferenças substanciais. Por isso, as pessoas conseguem interpretam de diferentes modos o Eixo da Resistência. Apesar da Síria, é importante ter em mente que Irã, Turquia e Qatar também estão em movimento de aproximação, parcialmente graças à hostilidade de EUA, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos contra a Fraternidade Muçulmana.
O que interessa é que há consenso crescente em torno de questões chaves nessa região e na definição de quais são os maiores problemas. E acho que, conforme passe o tempo, os movimentos tornar-se-ão mais influentes e mais poderosos. Não posso dizer se será tratado formal ou aberto de segurança coletiva, ou aliança militar, a ser criados por esses países em futuro próximo, nem vejo qualquer necessidade desses encaminhamentos. Contudo, entendo que essa convergência de ideias é muito importante. Acho que os laços formais e informais que existem entre esses países são, de vários modos, mais importantes e mais significativos que alianças formais políticas ou militares, ou tratados de segurança.
The Saker: Em meses recentes, muitos observadores afirmaram que Rússia e Israel estariam trabalhando lado a lado, e alguns disseram até que Putin seria basicamente peão do jogo de Netanyahu, e que a Rússia seria leal a interesses de Israel e dos sionistas. O senhor concorda com esse ponto de vista? Como os altos funcionários do Irã veem os contatos entre russos e israelenses? Essa aproximação os preocupa? Ou creem que esses contatos possam ser benéficos para o futuro da região?
Professor Marandi: Completo nonsense. Os governos de EUA e Israel são ligados entre eles, culturalmente e ideologicamente; e os norte-americanos cultivam profunda antipatia contra os russos. Essa é a razão pela qual a posição dos russos quanto à Síria é muito diferente da posição de norte-americanos e israelenses. Israelenses, EUA, União Europeia, sauditas e alguns dos países vizinhos da Síria apoiaram o ISIS, a Al-Qaeda e outras entidades extremistas, e fizeram de tudo para dividir a Síria. Como já explicamos, a visão dos russos sobre Israel é diferente da visão do Irã.
Há muitos russos imigrantes judeus em Israel; são parte muito considerável da população de colonos que ocupam a Palestina, e são amplamente instrumentalizados para aprofundar a subjugação do povo palestino e a ‘limpeza’ étnica. Dito em termos gerais, os interesses russos estão em agudo conflito com os interesses dos EUA, que são o mais forte aliado de Israel.
Além disso, a relação estreita entre Rússia e Síria data dos idos da Guerra Fria; e a incansável pressão dos EUA sobre China e Rússia também age como forte catalisador para acelerar a convergência de um país em direção ao outro, e também na direção do Irã em questões chaves.
Chineses e russos sabem muito bem que os EUA, os europeus e países regionais usaram extremistas na Síria para minar o estado; essas mesmas forças podem ser usadas mais tarde para minar a segurança na Ásia Central, Rússia e China. Grande número de russos, chineses e centro-asiáticos foram treinados para combater na Síria, e essa é grave ameaça à segurança coletiva. Os EUA podem usar esses e outros extremistas, em esforço para impedir o sucesso potencial da Iniciativa Cinturão e Estrada ou outros planos para integração asiática. Assim se vê que o conflito entre russos e norte-americanos é conflito agudo e crescente.
O regime israelense diz aos russos e aos chineses que Israel seria via de acesso até Washington e que, se mantiverem laços fortes com Israel, os israelenses poderão ajudá-los a resolver os problemas que os separam dos EUA. Não creio que haja dose confiável de verdade nisso, porque o conflito crescente tem a ver com o destino da dominância global pelos EUA; e não há o que os israelenses possam fazer para mudar isso. Mesmo assim esse ‘argumento’ tem sido usado como incentivo para que russos e chineses cuidem de preservar suas relações com o regime israelense.
Em qualquer caso, a Rússia não precisa manter visões idênticas às de Irã, Síria, Hezbollah, Líbano, Iraque ou Iêmen. Há diferenças, mas mesmo assim há relações muito fortes que se mantêm. Todos esses países reconhecem que, se os EUA conseguirem minar qualquer deles, seja Síria, Irã, Rússia ou China, esse resultado só encorajará os EUA a serem cada vez mais agressivos contra os demais países que se oponham aos objetivos da política exterior dos EUA ou que lá estejam como rivais potenciais, seja regionalmente ou globalmente. Assim sendo, ainda que as estruturas políticas sejam diferentes, ainda que as várias políticas externas sejam diversas, as semelhanças que mesmo assim se mantêm têm muito peso, tanto quanto as ameaças que todos esses países enfrentam. Mais uma vez: em grande medida, essa coalizão é resultado da política externa dos EUA e do ocidente em geral, que ainda se alimenta de fortes correntes subterrâneas de eurocentrismo, tribalismo e racismo.
Essa pressão fez com que esses países e esses movimentos se aproximassem uns dos outros e, mais importante que a proximidade, gerou compreensão mais profunda entre eles. Hoje, os russos conhecem e compreendem o Irã mais e melhor do que conheciam e compreendiam há cinco anos – efeito, em parte, da cooperação entre russos e iranianos na Síria. Nesse caso, a maior compreensão aprofunda o relacionamento e ajuda a dissipar muitas das incompreensões e muitos dos mitos que cada lado cultivasse em relação ao outro, ainda por efeito de narrativas eurocêntricas e do orientalismo.
Assim se compreende que o Irã não se preocupe com a relação entre russos e israelenses. Obviamente, num mundo ideal, o Irã talvez apreciasse que a Rússia rompesse relações com o regime israelense, por sua natureza de regime de apartheid. Mas a realidade é a realidade, e as relações dos iranianos com a Rússia são excelentes, e tenho certeza de que, vez ou outra, os iranianos servem-se dos russos para enviar ‘avisos’ aos israelenses.
The Saker: Como a Rússia é vista no Irã? Ainda há muitos iranianos que desconfiam da Rússia, ou a maioria dos iranianos acredita que tenham, na Rússia, um parceiro viável e honesto? Quais as principais preocupações e reservas que se encontram entre iranianos patriotas, quando pensam na Rússia?
Professor Marandi: Historicamente, os iranianos tiveram problemas sérios com os russos. Os russos e a União Soviética intervieram extensamente em assuntos internos do Irã, e agrediram a soberania iraniana. Mas desde o colapso da União Soviética, a imagem da Rússia mudou. Especialmente desde que a Rússia passou a combater ao lado do Irã na Síria, em 2015, a imagem da Rússia melhorou significativamente. Se se examinam as pesquisas, a imagem da Rússia é muito positiva, comparada a dos países ocidentais.
Governos ocidentais são proprietários diretos ou financiam dúzias de veículos de mídia em idioma persa. Esses veículos, como a Voz da América, e a BBC em persa, dentre outros, só fazem repetir propaganda anti-Rússia. Obviamente, isso tem algum impacto, que se soma às preocupações históricas que a Rússia sempre inspirou aos iranianos. Mas ainda assim a imagem dos russos é hoje relativamente favorável, o que não é dizer pouco.
The Saker: E quanto à Turquia? Irã e Turquia mantiveram relação complexa no passado, mesmo assim, no caso da guerra anglo-sionista contra a Síria, os dois estados trabalharam juntos (e com a Rússia). – Parece-lhe que isso signifique que a Turquia esteja sendo vista no Irã como parceira viável e honesta?
Professor Marandi: O relacionamento do Irã com o governo turco é complicado, especialmente por causa das muitas mudanças políticas que ocorreram na Turquia em anos recentes – o que fez o governo parecer pouco confiável aos olhos de muitos. Isso posto, a Turquia é muito diferente dos regimes influenciados pelos wahhabistas na Península Árabe. A tradição islâmica turca guarda semelhanças notáveis com a cultura islâmica iraniana e, graças à sua forte tradição sufista, a Turquia está muito mais perto do Irã do que, por exemplo, da Arábia Saudita wahhabista.
A ameaça wahhabista global cresceu como resultado do apoio financeiro dado pelos sauditas, e do apoio em geral de outros países na região do Golfo Persa. A sociedade turca foi mais resistente. Mas desde o conflito militar na Síria e dado o forte financiamento recebido do Golfo Persa, tem havido preocupação crescente quanto a um sectarismo crescente na Turquia, não muito diferente do que aconteceu no Paquistão nos anos 1980s.
Ironicamente, antes do conflito na Síria o presidente Erdogan mantinha relação pessoal muito mais próxima com o presidente Assad, do que os iranianos. Várias vezes as duas famílias passaram férias juntas.
Seja como for, a Turquia tem um relacionamento econômico, político e cultural muito forte com o Irã, e parte dos crescentes sentimentos antixiitas e de takfirismo que brotaram na Turquia foram estimulados pelo apoio que os sauditas e os emirados deram à tentativa de golpe na Turquia. Subsequentemente, o aberto antagonismo dos sauditas e emirados contra a Fraternidade Muçulmana e o Qatar; o apoio que deram ao golpe no Egito; suas políticas no Sudão e na Líbia e, claro, o assassinato de Jamal Khashoggi, contribuíram para facilitar as relações Irã-Turquia. Resultado disso, a Turquia foi-se posicionando numa maior distância dos antagonistas regionais do Irã. O apoio que os turcos dão à causa palestina é outro elemento que aproxima cada vez mais Irã e Turquia.
O apoio que os EUA dão aos terroristas do PKK na Síria também enfureceu os turcos, acrescentando novo impulso à convergência turco-iraniana. Até a política turca para a Síria está evoluindo, embora seja impossível para o governo fazer qualquer mudança radical, por causa de anos de esforços golpistas para promover mudança de regime.
The Saker: Agora, passando para o Iraque: como o senhor caracterizaria o “balanço das influências” de Irã e EUA no Iraque? Deve-se ver o governo do Iraque como aliado do Irã, como aliado dos EUA ou independente? Se o Império atacar o Irã, o que acontecerá no Iraque?
Professor Marandi: O relacionamento entre Iraque e Irã é significativamente mais importante que o relacionamento entre Iraque e EUA. Irã e Iraque são aliados, mas essa aliança em nada contradiz a noção da independência iraquiana. A política regional do Iraque não é idêntica à do Irã. Mas os dois países têm interesses muito similares; relacionamento muito próximo; muitos líderes iraquianos passaram anos no Irã, e a maioria da população do Iraque vive próxima da fronteira partilhada entre os dois países, por mais de 1.200 km. Comércio, peregrinações e turismo são atividades chave para os dois países. As semelhanças religiosas e os sítios religiosos que existem no Irã e Iraque são grande incentivo para a interação entre os dois países. Há muitos iraquianos que estudam no Irã, e muitos iranianos que trabalham no Iraque. O fato de que os iranianos fizeram muitos sacrifícios na luta contra o ISIS e a Al-Qaeda na Síria é forte indicação de como estão as coisas, apesar da pressão que fazem os EUA.
A peregrinação Arba’een realizada todos os anos, momento em que milhões de iranianos e iraquianos caminham até Karbala, lado a lado, com dezenas de milhares de voluntários iraquianos e iranianos que auxiliam os peregrinos ao longo do caminho, é, penso eu, mais um sinal eloquente desse relacionamento próximo.
Apesar de a presença dos EUA no Iraque continuar a ser hegemônica, o Irã nada fez para impedir que o Iraque tenha relações normais com outros países. Os EUA contudo continuam a tentar controlar o Iraque (mantêm lá a maior embaixada do mundo, presença militar e forte influência sobre a burocracia). Os EUA continuam a ter pesada influência sobre o modo como é gasta a riqueza gerada pelo petróleo iraquiano.
Mesmo assim, apesar do comportamento colonialista dos EUA, do assalto continuado à riqueza gerada pelo petróleo iraquiano e do comportamento bandido, ainda assim os iraquianos têm conseguido assegurar para si boa dose de independência.
No longo prazo, esse continuado comportamento dos EUA só criará cada vez maior ressentimento entre os iraquianos. O império raramente leva em consideração essas realidades. Forças imperialistas só buscam acumular riqueza e capacidade para influenciar o estado mediante a força bruta – atitude que, no longo termo cria ira e hostilidade profundamente enraizadas as quais, em algum momento, criarão graves problemas para o império, especialmente porque ira e agitação crescem e alastram-se pela região, se não já por todo o globo.
É altamente improvável que o regime em Washington ataque o Irã. Se o fizer, criará uma guerra regional, a qual expulsará os EUA para bem longe de Iraque, Afeganistão, Líbano e Síria. A Arábia Saudita e os Emirados rapidamente entrarão em colapso e o preço do petróleo e do gás natural chegará à estratosfera, o que levará a economia global ao caos, com milhões de pessoas tentando chegar à Europa.
The Saker: Diz-se com frequência que Rússia e Irã têm objetivos fundamentalmente diferentes na Síria e que os dois países continuam a enfrentar tensões fortíssimas entre eles, por causa desses desacordos. É verdade? Em sua opinião, em que diferem os objetivos de russos e iranianos na Síria?
Professor Marandi: Notícias que se ouvem às vezes sobre graves tensões que haveria entre iranianos e russos na Síria são quase sempre nonsense. Há razões conhecidas para que as pessoas exagerem pequenos incidentes, ou inventem completamente eventos que jamais aconteceram, mas o relacionamento é muito bom. O Irã absolutamente não planeja construir bases militares na Síria, e os russos sentem a necessidade de preservar a própria presença militar na síria mediante acordos de longo prazo.
O Irã gostaria de capacitar a Síria para obter capacidade militar para retomar as colinas do Golan ocupadas por Israel. Mas o Irã não tem intenções de iniciar qualquer conflito com o regime israelense dentro da Palestina. Não é objetivo no Líbano, como tampouco é objetivo na Síria.
Como no Líbano, onde os iranianos apoiaram o Hezbollah para restaurar a soberania libanesa e expulsar de lá os agressores e ocupantes israelenses, assim também os iranianos têm agenda equivalente na Síria. Querem apoiar os sírios, de modo a que tenham capacidade para restaurar sua plena soberania. Não creio que as colinas do Golan sejam prioridade para os russos.
The Saker: Por algum tempo, o Irã permitiu que as Forças Aeroespaciais Russas usassem um campo militar de pouso; depois, quando a notícias espalhou-se, os russos foram convidados a sair. Ouvi rumores segundo os quais só o Corpo de Guardas da Revolução Islâmica (CGRI, ing. IRGC) teria sido favorável a permitir que as Forças Aeroespaciais Russas usassem aquela pista militar de pouso; e que as forças regulares opunham-se à permissão. É verdade que há diferenças desse tipo entre o CGRI e as forças armadas regulares iranianas? O senhor crê que o Irã algum dia permitirá que os russos estabeleçam presença militar permanente no Irã?
Professor Marandi: Tudo isso é mito. Os russos não foram convidados a sair do Irã. Não há diferenças entre o CGRI qualquer outra parte das forças armadas iranianas. A decisão foi tomada pelo Conselho Supremo de Segurança Nacional e o presidente e todos os altos comandantes militares participaram dessa decisão. Na verdade, a base aérea não pertence ao CGRI, mas à força aérea; uma parte da base foi usada por bombardeiros estratégicos russos que voavam para a Síria para atacar extremistas. A cooperação terminou quando os russos puderam alocar número adequado de aeronaves na Síria, porque os voos sobre o Irã eram longos e caros, enquanto a campanha aérea a partir de bases dentro da Síria era muito menos cara e muito mais efetiva. O Irã foi muito aberto e explícito sobre o relacionamento que o país mantinha com os russos, e permitiram abertamente que os russos disparassem mísseis que cruzavam o espaço aéreo iraniano.
Houve oposição à presença de russos na base aérea iraniana. Um pequeno segmento da sociedade iraniana, dos que são pró-ocidente e pró-EUA, muito protestou em veículos da mídia contra aquela base, mas esse protesto não teve absolutamente impacto algum no processo de tomada de decisões. Segundo pesquisas, maioria muito ampla da população iraniana aprovava as atividades na Síria; e o Conselho Supremo de Segurança Nacional absolutamente não estava sob pressão, ao tomar aquela decisão. Mas o Irã não tem planos de permitir que qualquer país tenha bases permanentes em território iraniano, e isso está conforme com a Constituição da República Islâmica do Irã.
A revolução no Irã foi um projeto de independência, dignidade, soberania e valores indígenas; e pôr fim à hegemonia dos EUA sobre o Irã foi parte importante daquele projeto. Os iranianos não cederão bases a potências estrangeiras, e nem russos nem chineses jamais apresentaram tais demandas. Absolutamente não há diferenças quanto a políticas regionais do Irã entre o CGRI e os demais militares; e todos participaram do processo de tomada de decisões que autorizou os russos a disparar mísseis que sobrevoavam território iraniano; e todos participaram do processo que levou à autorização para que a aviação russa usasse o espaço aéreo do Irã. Os russos estavam dando apoio aéreo a tropas iranianas e a grupos aliados do Irã que combatiam em terra.
The Saker: Ambos, o aiatolá Ali Khamenei e o secretário-geral do Hezbollah Hassan Nasrallah, repetiram em várias falas e declarações, que estão contados os dias do regime racista-sionista de apartheid nos territórios ocupados. O senhor concorda com esse ponto de vista? E, se concorda, como o senhor prevê que aconteça essa mudança de regime? Na sua avaliação, que solução – de Um Estado, ou de Dois Estados – é a mais realista?
Professor Marandi: Não acredito que a solução de Dois Estados seja possível, porque o regime israelense já colonizou área grande demais, na Cisjordânia. Na verdade, com seus atos de egoísmo e visão miseravelmente caolha, o regime israelense causou terrível dano a si mesmo. Como resultado da colonização da Cisjordânia, até diplomatas e elites europeias já admitem privadamente que as políticas implantadas pelo regime de Israel são políticas de apartheid. Até quem acalenta esperanças de que se alcance uma solução de dois estados já admite que essa ideia está morta. Todos os palestinos são tratados como subumanos, residam na Cisjordânia ou não. São nação subjugada, sejam cidadãos israelenses ou não. E absolutamente já não há qualquer esperança de que os que vivem na Cisjordânia voltem a recuperar a liberdade que perderam; já previmos que os israelenses jamais entregarão voluntariamente a Cisjordânia ocupada.
Esse é o mais importante desafio que o regime sionista de Israel enfrenta hoje e para o futuro. Ao colonizar a Cisjordânia – e digam o que disserem as narrativas governamentais e oficiais ocidentais –, Israel deixa-se ver aos olhos da comunidade internacional como o regime de apartheid que é. Israel está-se deslegitimando aos olhos de grande número de pessoas.
Além disso, Israel já não consegue agir impunemente. A guerra de 2006 no Líbano, na qual o Hizbullah derrotou as forças armadas israelenses foi um ponto de virada. Antes daquela derrota, os israelenses haviam criado e conseguiam ainda manter a fantasia de que seriam invencíveis. Hoje, nem em Gaza conseguem impor a própria vontade e alcançar seus objetivos políticos, quando atacam de tempos em tempos os territórios ocupados e as populações civis que ali vivem.
Hoje é muito mais fácil conter os israelenses sionistas, especialmente desde que o governo sírio conseguiu restaurar a ordem e expulsar ISIS e al-Qaeda das áreas próximas dos setores ocupados por forças de Israel nas colinas do Golan – apesar do apoio que os extremistas recebem do estado de Israel.
A Israel sionista foi contida regionalmente; e até entre israelenses os sionistas são vistos como regime de apartheid. E seus aliados regionais também estão em declínio na região. Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos são os únicos países que podem ser considerados aliados efetivos dos sionistas israelenses; e todos esses estados enfrentam crise de declínio terminal.
Tudo isso considerado, vê-se que o regime israelense vai-se tornando cada vez mais isolado; não creio que consiga durar ainda muito tempo nessas circunstâncias. Assim como o regime deapartheid na África do Sul colapsou sob o peso da própria existência imoral, assim também sucumbirá o regime sionista de Israel. Não pode ser diferente.
Não haverá solução de Dois Estados. A única solução realista e moral é a Palestina ser reunificada, e restaurados todos os direitos da população nativa, sejam palestinos, judeus ou cristão ou o que mais sejam os legítimos proprietários indígenas da terra.
The Saker: O Irã é República Islâmica. Também é país de maioria xiita. Alguns observadores acusam o Irã de desejar exportar o próprio modelo político para outros países. O que o senhor pensa dessa acusação? Os intelectuais islâmicos iranianos acreditam que seja possível exportar para outros países, inclusive para países sunitas, o modelo da República Islâmica do Irã?
Professor Marandi: Não me parece que haja qualquer validade nessa acusação. O Irã tem relacionamento absolutamente excelente com o Iraque, e nem por isso impôs o próprio modelo aos iraquianos. De fato, o Irã ajudou a criar a Constituição que atualmente rege o Iraque. O mesmo vale para Líbano e Iêmen.
O Irã é frequentemente acusado por seus antagonistas, mas as acusações são sempre inconsistentes. Frequentemente dizem que o Irã teria medo de o ‘outro’ modelo ser exportado, porque os iranianos temeriam qualquer rival. O Irã sempre foi atacado por todos os lados, com frequência mediante argumentos que se contradizem entre eles. Por um lado, dizem que o chamado regime seria imensamente impopular, corrupto, estaria caindo aos pedaços e seria incapaz até de impor a própria autoridade interna. Por outro lado, o Irã seria ameaça sempre crescente a toda a região e ao mundo. É paradoxal: como o Irã poderia ser incompetente e estar à beira do colapso e, ao mesmo tempo, ser tão terrível ameaça sempre crescente contra todo o planeta? Nada aí faz qualquer sentido.
Seja como for, jamais vi qualquer sinal de que o Irã tenha tentado impor o próprio modelo a outros países ou a movimentos muito próximos dos iranianos. Não fosse o apoio do Irã, ISIS e al-Qaeda teriam destruído a Síria com seu governo secular e sua Constituição secular. Os iranianos creem firmemente que as forças terroristas apoiadas pelos serviços ocidentais de inteligência e por regimes regionais sempre seriam o pior cenário possível para o povo sírio. Nem por isso impuseram o próprio modelo.
The Saker: Fala-se muito de um “Eixo da Resistência”, que incluiria Síria, Hezbollah, Irã, Rússia e China. Às vezes, também são incluídos nessas listas os estados de Venezuela, Cuba ou a República Popular Democrática da Coreia, RPDC (“Coreia do Norte”). O senhor acredita que exista esse “Eixo da Resistência”? E caso acredite, como o senhor caracteriza a natureza dessa aliança informal? O senhor acha que essa aliança informal pode vir a crescer e tornar-se aliança política ou militar formal, ou algum tratado de segurança coletiva?
Professor Marandi: Acredito firmemente que, sim, há um Eixo da Resistência que, hoje, inclui realmente Irã, Síria, Iraque, Gaza, Líbano, partes do Afeganistão, e Iêmen. Não acho que se possa incluir, seja pela via que for, a RPDC. Creio que a Rússia possa ser considerada até certo ponto como alinhada ou afiliada a essa Resistência, mas bem poucos sentirão a necessidade de reconhecer essa realidade. Em certos níveis, há ampla superposição de políticas russas e chinesas e de políticas dos países e movimentos nessa região afiliados a esse Eixo da Resistência. O mesmo vale para Venezuela, Bolívia e Cuba – países que absolutamente não considero semelhantes à Coreia do Norte.
Como em praticamente todos os pontos do planeta, a política dos EUA na Coreia do Norte é feia, hegemonista e de má-fé. Mas a natureza do governo da RPDC é fundamentalmente diferente do que são Venezuela ou Cuba, gostem os norte-americanos e europeus de reconhecer essa evidência, ou não. Outros interpretam o Eixo da Resistência de modo a incluir ou excluir determinados países, mas é perfeitamente claro que Irã e Rússia têm objetivos políticos similares, no que tenha a ver com algumas questões chaves.
Apesar de tudo, a Rússia tem relação muito próxima com o regime israelense, o qual, para o Irã, é estado de apartheid, quase idêntico ao apartheid que marcou a África do Sul. E também, por exemplo, a posição do governo sírio em relação a Israel é diferente da posição do Irã.
A posição oficial do governo sírio é que Cisjordânia e Faixa de Gaza têm de ser devolvidas aos palestinos, em obediência a Resoluções do Conselho de Segurança da ONU; e que as colinas ocupadas do Golan têm de ser devolvidas ao povo sírio. Todas essas são demandas legítimas.
O Irã crê firmemente que Israel é regime colonial de apartheid, regime moralmente inaceitável na forma que tem hoje. Assim sendo, pelo menos oficialmente, há diferenças substanciais. Por isso, as pessoas conseguem interpretam de diferentes modos o Eixo da Resistência. Apesar da Síria, é importante ter em mente que Irã, Turquia e Qatar também estão em movimento de aproximação, parcialmente graças à hostilidade de EUA, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos contra a Fraternidade Muçulmana.
O que interessa é que há consenso crescente em torno de questões chaves nessa região e na definição de quais são os maiores problemas. E acho que, conforme passe o tempo, os movimentos tornar-se-ão mais influentes e mais poderosos. Não posso dizer se será tratado formal ou aberto de segurança coletiva, ou aliança militar, a ser criados por esses países em futuro próximo, nem vejo qualquer necessidade desses encaminhamentos. Contudo, entendo que essa convergência de ideias é muito importante. Acho que os laços formais e informais que existem entre esses países são, de vários modos, mais importantes e mais significativos que alianças formais políticas ou militares, ou tratados de segurança.
The Saker: Em meses recentes, muitos observadores afirmaram que Rússia e Israel estariam trabalhando lado a lado, e alguns disseram até que Putin seria basicamente peão do jogo de Netanyahu, e que a Rússia seria leal a interesses de Israel e dos sionistas. O senhor concorda com esse ponto de vista? Como os altos funcionários do Irã veem os contatos entre russos e israelenses? Essa aproximação os preocupa? Ou creem que esses contatos possam ser benéficos para o futuro da região?
Professor Marandi: Completo nonsense. Os governos de EUA e Israel são ligados entre eles, culturalmente e ideologicamente; e os norte-americanos cultivam profunda antipatia contra os russos. Essa é a razão pela qual a posição dos russos quanto à Síria é muito diferente da posição de norte-americanos e israelenses. Israelenses, EUA, União Europeia, sauditas e alguns dos países vizinhos da Síria apoiaram o ISIS, a Al-Qaeda e outras entidades extremistas, e fizeram de tudo para dividir a Síria. Como já explicamos, a visão dos russos sobre Israel é diferente da visão do Irã.
Há muitos russos imigrantes judeus em Israel; são parte muito considerável da população de colonos que ocupam a Palestina, e são amplamente instrumentalizados para aprofundar a subjugação do povo palestino e a ‘limpeza’ étnica. Dito em termos gerais, os interesses russos estão em agudo conflito com os interesses dos EUA, que são o mais forte aliado de Israel.
Além disso, a relação estreita entre Rússia e Síria data dos idos da Guerra Fria; e a incansável pressão dos EUA sobre China e Rússia também age como forte catalisador para acelerar a convergência de um país em direção ao outro, e também na direção do Irã em questões chaves.
Chineses e russos sabem muito bem que os EUA, os europeus e países regionais usaram extremistas na Síria para minar o estado; essas mesmas forças podem ser usadas mais tarde para minar a segurança na Ásia Central, Rússia e China. Grande número de russos, chineses e centro-asiáticos foram treinados para combater na Síria, e essa é grave ameaça à segurança coletiva. Os EUA podem usar esses e outros extremistas, em esforço para impedir o sucesso potencial da Iniciativa Cinturão e Estrada ou outros planos para integração asiática. Assim se vê que o conflito entre russos e norte-americanos é conflito agudo e crescente.
O regime israelense diz aos russos e aos chineses que Israel seria via de acesso até Washington e que, se mantiverem laços fortes com Israel, os israelenses poderão ajudá-los a resolver os problemas que os separam dos EUA. Não creio que haja dose confiável de verdade nisso, porque o conflito crescente tem a ver com o destino da dominância global pelos EUA; e não há o que os israelenses possam fazer para mudar isso. Mesmo assim esse ‘argumento’ tem sido usado como incentivo para que russos e chineses cuidem de preservar suas relações com o regime israelense.
Em qualquer caso, a Rússia não precisa manter visões idênticas às de Irã, Síria, Hezbollah, Líbano, Iraque ou Iêmen. Há diferenças, mas mesmo assim há relações muito fortes que se mantêm. Todos esses países reconhecem que, se os EUA conseguirem minar qualquer deles, seja Síria, Irã, Rússia ou China, esse resultado só encorajará os EUA a serem cada vez mais agressivos contra os demais países que se oponham aos objetivos da política exterior dos EUA ou que lá estejam como rivais potenciais, seja regionalmente ou globalmente. Assim sendo, ainda que as estruturas políticas sejam diferentes, ainda que as várias políticas externas sejam diversas, as semelhanças que mesmo assim se mantêm têm muito peso, tanto quanto as ameaças que todos esses países enfrentam. Mais uma vez: em grande medida, essa coalizão é resultado da política externa dos EUA e do ocidente em geral, que ainda se alimenta de fortes correntes subterrâneas de eurocentrismo, tribalismo e racismo.
Essa pressão fez com que esses países e esses movimentos se aproximassem uns dos outros e, mais importante que a proximidade, gerou compreensão mais profunda entre eles. Hoje, os russos conhecem e compreendem o Irã mais e melhor do que conheciam e compreendiam há cinco anos – efeito, em parte, da cooperação entre russos e iranianos na Síria. Nesse caso, a maior compreensão aprofunda o relacionamento e ajuda a dissipar muitas das incompreensões e muitos dos mitos que cada lado cultivasse em relação ao outro, ainda por efeito de narrativas eurocêntricas e do orientalismo.
Assim se compreende que o Irã não se preocupe com a relação entre russos e israelenses. Obviamente, num mundo ideal, o Irã talvez apreciasse que a Rússia rompesse relações com o regime israelense, por sua natureza de regime de apartheid. Mas a realidade é a realidade, e as relações dos iranianos com a Rússia são excelentes, e tenho certeza de que, vez ou outra, os iranianos servem-se dos russos para enviar ‘avisos’ aos israelenses.
The Saker: Como a Rússia é vista no Irã? Ainda há muitos iranianos que desconfiam da Rússia, ou a maioria dos iranianos acredita que tenham, na Rússia, um parceiro viável e honesto? Quais as principais preocupações e reservas que se encontram entre iranianos patriotas, quando pensam na Rússia?
Professor Marandi: Historicamente, os iranianos tiveram problemas sérios com os russos. Os russos e a União Soviética intervieram extensamente em assuntos internos do Irã, e agrediram a soberania iraniana. Mas desde o colapso da União Soviética, a imagem da Rússia mudou. Especialmente desde que a Rússia passou a combater ao lado do Irã na Síria, em 2015, a imagem da Rússia melhorou significativamente. Se se examinam as pesquisas, a imagem da Rússia é muito positiva, comparada a dos países ocidentais.
Governos ocidentais são proprietários diretos ou financiam dúzias de veículos de mídia em idioma persa. Esses veículos, como a Voz da América, e a BBC em persa, dentre outros, só fazem repetir propaganda anti-Rússia. Obviamente, isso tem algum impacto, que se soma às preocupações históricas que a Rússia sempre inspirou aos iranianos. Mas ainda assim a imagem dos russos é hoje relativamente favorável, o que não é dizer pouco.
The Saker: E quanto à Turquia? Irã e Turquia mantiveram relação complexa no passado, mesmo assim, no caso da guerra anglo-sionista contra a Síria, os dois estados trabalharam juntos (e com a Rússia). – Parece-lhe que isso signifique que a Turquia esteja sendo vista no Irã como parceira viável e honesta?
Professor Marandi: O relacionamento do Irã com o governo turco é complicado, especialmente por causa das muitas mudanças políticas que ocorreram na Turquia em anos recentes – o que fez o governo parecer pouco confiável aos olhos de muitos. Isso posto, a Turquia é muito diferente dos regimes influenciados pelos wahhabistas na Península Árabe. A tradição islâmica turca guarda semelhanças notáveis com a cultura islâmica iraniana e, graças à sua forte tradição sufista, a Turquia está muito mais perto do Irã do que, por exemplo, da Arábia Saudita wahhabista.
A ameaça wahhabista global cresceu como resultado do apoio financeiro dado pelos sauditas, e do apoio em geral de outros países na região do Golfo Persa. A sociedade turca foi mais resistente. Mas desde o conflito militar na Síria e dado o forte financiamento recebido do Golfo Persa, tem havido preocupação crescente quanto a um sectarismo crescente na Turquia, não muito diferente do que aconteceu no Paquistão nos anos 1980s.
Ironicamente, antes do conflito na Síria o presidente Erdogan mantinha relação pessoal muito mais próxima com o presidente Assad, do que os iranianos. Várias vezes as duas famílias passaram férias juntas.
Seja como for, a Turquia tem um relacionamento econômico, político e cultural muito forte com o Irã, e parte dos crescentes sentimentos antixiitas e de takfirismo que brotaram na Turquia foram estimulados pelo apoio que os sauditas e os emirados deram à tentativa de golpe na Turquia. Subsequentemente, o aberto antagonismo dos sauditas e emirados contra a Fraternidade Muçulmana e o Qatar; o apoio que deram ao golpe no Egito; suas políticas no Sudão e na Líbia e, claro, o assassinato de Jamal Khashoggi, contribuíram para facilitar as relações Irã-Turquia. Resultado disso, a Turquia foi-se posicionando numa maior distância dos antagonistas regionais do Irã. O apoio que os turcos dão à causa palestina é outro elemento que aproxima cada vez mais Irã e Turquia.
O apoio que os EUA dão aos terroristas do PKK na Síria também enfureceu os turcos, acrescentando novo impulso à convergência turco-iraniana. Até a política turca para a Síria está evoluindo, embora seja impossível para o governo fazer qualquer mudança radical, por causa de anos de esforços golpistas para promover mudança de regime.
The Saker: Agora, passando para o Iraque: como o senhor caracterizaria o “balanço das influências” de Irã e EUA no Iraque? Deve-se ver o governo do Iraque como aliado do Irã, como aliado dos EUA ou independente? Se o Império atacar o Irã, o que acontecerá no Iraque?
Professor Marandi: O relacionamento entre Iraque e Irã é significativamente mais importante que o relacionamento entre Iraque e EUA. Irã e Iraque são aliados, mas essa aliança em nada contradiz a noção da independência iraquiana. A política regional do Iraque não é idêntica à do Irã. Mas os dois países têm interesses muito similares; relacionamento muito próximo; muitos líderes iraquianos passaram anos no Irã, e a maioria da população do Iraque vive próxima da fronteira partilhada entre os dois países, por mais de 1.200 km. Comércio, peregrinações e turismo são atividades chave para os dois países. As semelhanças religiosas e os sítios religiosos que existem no Irã e Iraque são grande incentivo para a interação entre os dois países. Há muitos iraquianos que estudam no Irã, e muitos iranianos que trabalham no Iraque. O fato de que os iranianos fizeram muitos sacrifícios na luta contra o ISIS e a Al-Qaeda na Síria é forte indicação de como estão as coisas, apesar da pressão que fazem os EUA.
A peregrinação Arba’een realizada todos os anos, momento em que milhões de iranianos e iraquianos caminham até Karbala, lado a lado, com dezenas de milhares de voluntários iraquianos e iranianos que auxiliam os peregrinos ao longo do caminho, é, penso eu, mais um sinal eloquente desse relacionamento próximo.
Apesar de a presença dos EUA no Iraque continuar a ser hegemônica, o Irã nada fez para impedir que o Iraque tenha relações normais com outros países. Os EUA contudo continuam a tentar controlar o Iraque (mantêm lá a maior embaixada do mundo, presença militar e forte influência sobre a burocracia). Os EUA continuam a ter pesada influência sobre o modo como é gasta a riqueza gerada pelo petróleo iraquiano.
Mesmo assim, apesar do comportamento colonialista dos EUA, do assalto continuado à riqueza gerada pelo petróleo iraquiano e do comportamento bandido, ainda assim os iraquianos têm conseguido assegurar para si boa dose de independência.
No longo prazo, esse continuado comportamento dos EUA só criará cada vez maior ressentimento entre os iraquianos. O império raramente leva em consideração essas realidades. Forças imperialistas só buscam acumular riqueza e capacidade para influenciar o estado mediante a força bruta – atitude que, no longo termo cria ira e hostilidade profundamente enraizadas as quais, em algum momento, criarão graves problemas para o império, especialmente porque ira e agitação crescem e alastram-se pela região, se não já por todo o globo.
É altamente improvável que o regime em Washington ataque o Irã. Se o fizer, criará uma guerra regional, a qual expulsará os EUA para bem longe de Iraque, Afeganistão, Líbano e Síria. A Arábia Saudita e os Emirados rapidamente entrarão em colapso e o preço do petróleo e do gás natural chegará à estratosfera, o que levará a economia global ao caos, com milhões de pessoas tentando chegar à Europa.
The Saker: Diz-se com frequência que Rússia e Irã têm objetivos fundamentalmente diferentes na Síria e que os dois países continuam a enfrentar tensões fortíssimas entre eles, por causa desses desacordos. É verdade? Em sua opinião, em que diferem os objetivos de russos e iranianos na Síria?
Professor Marandi: Notícias que se ouvem às vezes sobre graves tensões que haveria entre iranianos e russos na Síria são quase sempre nonsense. Há razões conhecidas para que as pessoas exagerem pequenos incidentes, ou inventem completamente eventos que jamais aconteceram, mas o relacionamento é muito bom. O Irã absolutamente não planeja construir bases militares na Síria, e os russos sentem a necessidade de preservar a própria presença militar na síria mediante acordos de longo prazo.
O Irã gostaria de capacitar a Síria para obter capacidade militar para retomar as colinas do Golan ocupadas por Israel. Mas o Irã não tem intenções de iniciar qualquer conflito com o regime israelense dentro da Palestina. Não é objetivo no Líbano, como tampouco é objetivo na Síria.
Como no Líbano, onde os iranianos apoiaram o Hezbollah para restaurar a soberania libanesa e expulsar de lá os agressores e ocupantes israelenses, assim também os iranianos têm agenda equivalente na Síria. Querem apoiar os sírios, de modo a que tenham capacidade para restaurar sua plena soberania. Não creio que as colinas do Golan sejam prioridade para os russos.
The Saker: Por algum tempo, o Irã permitiu que as Forças Aeroespaciais Russas usassem um campo militar de pouso; depois, quando a notícias espalhou-se, os russos foram convidados a sair. Ouvi rumores segundo os quais só o Corpo de Guardas da Revolução Islâmica (CGRI, ing. IRGC) teria sido favorável a permitir que as Forças Aeroespaciais Russas usassem aquela pista militar de pouso; e que as forças regulares opunham-se à permissão. É verdade que há diferenças desse tipo entre o CGRI e as forças armadas regulares iranianas? O senhor crê que o Irã algum dia permitirá que os russos estabeleçam presença militar permanente no Irã?
Professor Marandi: Tudo isso é mito. Os russos não foram convidados a sair do Irã. Não há diferenças entre o CGRI qualquer outra parte das forças armadas iranianas. A decisão foi tomada pelo Conselho Supremo de Segurança Nacional e o presidente e todos os altos comandantes militares participaram dessa decisão. Na verdade, a base aérea não pertence ao CGRI, mas à força aérea; uma parte da base foi usada por bombardeiros estratégicos russos que voavam para a Síria para atacar extremistas. A cooperação terminou quando os russos puderam alocar número adequado de aeronaves na Síria, porque os voos sobre o Irã eram longos e caros, enquanto a campanha aérea a partir de bases dentro da Síria era muito menos cara e muito mais efetiva. O Irã foi muito aberto e explícito sobre o relacionamento que o país mantinha com os russos, e permitiram abertamente que os russos disparassem mísseis que cruzavam o espaço aéreo iraniano.
Houve oposição à presença de russos na base aérea iraniana. Um pequeno segmento da sociedade iraniana, dos que são pró-ocidente e pró-EUA, muito protestou em veículos da mídia contra aquela base, mas esse protesto não teve absolutamente impacto algum no processo de tomada de decisões. Segundo pesquisas, maioria muito ampla da população iraniana aprovava as atividades na Síria; e o Conselho Supremo de Segurança Nacional absolutamente não estava sob pressão, ao tomar aquela decisão. Mas o Irã não tem planos de permitir que qualquer país tenha bases permanentes em território iraniano, e isso está conforme com a Constituição da República Islâmica do Irã.
A revolução no Irã foi um projeto de independência, dignidade, soberania e valores indígenas; e pôr fim à hegemonia dos EUA sobre o Irã foi parte importante daquele projeto. Os iranianos não cederão bases a potências estrangeiras, e nem russos nem chineses jamais apresentaram tais demandas. Absolutamente não há diferenças quanto a políticas regionais do Irã entre o CGRI e os demais militares; e todos participaram do processo de tomada de decisões que autorizou os russos a disparar mísseis que sobrevoavam território iraniano; e todos participaram do processo que levou à autorização para que a aviação russa usasse o espaço aéreo do Irã. Os russos estavam dando apoio aéreo a tropas iranianas e a grupos aliados do Irã que combatiam em terra.
The Saker: Ambos, o aiatolá Ali Khamenei e o secretário-geral do Hezbollah Hassan Nasrallah, repetiram em várias falas e declarações, que estão contados os dias do regime racista-sionista de apartheid nos territórios ocupados. O senhor concorda com esse ponto de vista? E, se concorda, como o senhor prevê que aconteça essa mudança de regime? Na sua avaliação, que solução – de Um Estado, ou de Dois Estados – é a mais realista?
Professor Marandi: Não acredito que a solução de Dois Estados seja possível, porque o regime israelense já colonizou área grande demais, na Cisjordânia. Na verdade, com seus atos de egoísmo e visão miseravelmente caolha, o regime israelense causou terrível dano a si mesmo. Como resultado da colonização da Cisjordânia, até diplomatas e elites europeias já admitem privadamente que as políticas implantadas pelo regime de Israel são políticas de apartheid. Até quem acalenta esperanças de que se alcance uma solução de dois estados já admite que essa ideia está morta. Todos os palestinos são tratados como subumanos, residam na Cisjordânia ou não. São nação subjugada, sejam cidadãos israelenses ou não. E absolutamente já não há qualquer esperança de que os que vivem na Cisjordânia voltem a recuperar a liberdade que perderam; já previmos que os israelenses jamais entregarão voluntariamente a Cisjordânia ocupada.
Esse é o mais importante desafio que o regime sionista de Israel enfrenta hoje e para o futuro. Ao colonizar a Cisjordânia – e digam o que disserem as narrativas governamentais e oficiais ocidentais –, Israel deixa-se ver aos olhos da comunidade internacional como o regime de apartheid que é. Israel está-se deslegitimando aos olhos de grande número de pessoas.
Além disso, Israel já não consegue agir impunemente. A guerra de 2006 no Líbano, na qual o Hizbullah derrotou as forças armadas israelenses foi um ponto de virada. Antes daquela derrota, os israelenses haviam criado e conseguiam ainda manter a fantasia de que seriam invencíveis. Hoje, nem em Gaza conseguem impor a própria vontade e alcançar seus objetivos políticos, quando atacam de tempos em tempos os territórios ocupados e as populações civis que ali vivem.
Hoje é muito mais fácil conter os israelenses sionistas, especialmente desde que o governo sírio conseguiu restaurar a ordem e expulsar ISIS e al-Qaeda das áreas próximas dos setores ocupados por forças de Israel nas colinas do Golan – apesar do apoio que os extremistas recebem do estado de Israel.
A Israel sionista foi contida regionalmente; e até entre israelenses os sionistas são vistos como regime de apartheid. E seus aliados regionais também estão em declínio na região. Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos são os únicos países que podem ser considerados aliados efetivos dos sionistas israelenses; e todos esses estados enfrentam crise de declínio terminal.
Tudo isso considerado, vê-se que o regime israelense vai-se tornando cada vez mais isolado; não creio que consiga durar ainda muito tempo nessas circunstâncias. Assim como o regime deapartheid na África do Sul colapsou sob o peso da própria existência imoral, assim também sucumbirá o regime sionista de Israel. Não pode ser diferente.
Não haverá solução de Dois Estados. A única solução realista e moral é a Palestina ser reunificada, e restaurados todos os direitos da população nativa, sejam palestinos, judeus ou cristão ou o que mais sejam os legítimos proprietários indígenas da terra.
The Saker: O Irã é República Islâmica. Também é país de maioria xiita. Alguns observadores acusam o Irã de desejar exportar o próprio modelo político para outros países. O que o senhor pensa dessa acusação? Os intelectuais islâmicos iranianos acreditam que seja possível exportar para outros países, inclusive para países sunitas, o modelo da República Islâmica do Irã?
Professor Marandi: Não me parece que haja qualquer validade nessa acusação. O Irã tem relacionamento absolutamente excelente com o Iraque, e nem por isso impôs o próprio modelo aos iraquianos. De fato, o Irã ajudou a criar a Constituição que atualmente rege o Iraque. O mesmo vale para Líbano e Iêmen.
O Irã é frequentemente acusado por seus antagonistas, mas as acusações são sempre inconsistentes. Frequentemente dizem que o Irã teria medo de o ‘outro’ modelo ser exportado, porque os iranianos temeriam qualquer rival. O Irã sempre foi atacado por todos os lados, com frequência mediante argumentos que se contradizem entre eles. Por um lado, dizem que o chamado regime seria imensamente impopular, corrupto, estaria caindo aos pedaços e seria incapaz até de impor a própria autoridade interna. Por outro lado, o Irã seria ameaça sempre crescente a toda a região e ao mundo. É paradoxal: como o Irã poderia ser incompetente e estar à beira do colapso e, ao mesmo tempo, ser tão terrível ameaça sempre crescente contra todo o planeta? Nada aí faz qualquer sentido.
Seja como for, jamais vi qualquer sinal de que o Irã tenha tentado impor o próprio modelo a outros países ou a movimentos muito próximos dos iranianos. Não fosse o apoio do Irã, ISIS e al-Qaeda teriam destruído a Síria com seu governo secular e sua Constituição secular. Os iranianos creem firmemente que as forças terroristas apoiadas pelos serviços ocidentais de inteligência e por regimes regionais sempre seriam o pior cenário possível para o povo sírio. Nem por isso impuseram o próprio modelo.
The Saker: Muito obrigado por responder nossas perguntas!*******
The Saker: Fala-se muito de um “Eixo da Resistência”, que incluiria Síria, Hezbollah, Irã, Rússia e China. Às vezes, também são incluídos nessas listas os estados de Venezuela, Cuba ou a República Popular Democrática da Coreia, RPDC (“Coreia do Norte”). O senhor acredita que exista esse “Eixo da Resistência”? E caso acredite, como o senhor caracteriza a natureza dessa aliança informal? O senhor acha que essa aliança informal pode vir a crescer e tornar-se aliança política ou militar formal, ou algum tratado de segurança coletiva?
Professor Marandi: Acredito firmemente que, sim, há um Eixo da Resistência que, hoje, inclui realmente Irã, Síria, Iraque, Gaza, Líbano, partes do Afeganistão, e Iêmen. Não acho que se possa incluir, seja pela via que for, a RPDC. Creio que a Rússia possa ser considerada até certo ponto como alinhada ou afiliada a essa Resistência, mas bem poucos sentirão a necessidade de reconhecer essa realidade. Em certos níveis, há ampla superposição de políticas russas e chinesas e de políticas dos países e movimentos nessa região afiliados a esse Eixo da Resistência. O mesmo vale para Venezuela, Bolívia e Cuba – países que absolutamente não considero semelhantes à Coreia do Norte.
Como em praticamente todos os pontos do planeta, a política dos EUA na Coreia do Norte é feia, hegemonista e de má-fé. Mas a natureza do governo da RPDC é fundamentalmente diferente do que são Venezuela ou Cuba, gostem os norte-americanos e europeus de reconhecer essa evidência, ou não. Outros interpretam o Eixo da Resistência de modo a incluir ou excluir determinados países, mas é perfeitamente claro que Irã e Rússia têm objetivos políticos similares, no que tenha a ver com algumas questões chaves.
Apesar de tudo, a Rússia tem relação muito próxima com o regime israelense, o qual, para o Irã, é estado de apartheid, quase idêntico ao apartheid que marcou a África do Sul. E também, por exemplo, a posição do governo sírio em relação a Israel é diferente da posição do Irã.
A posição oficial do governo sírio é que Cisjordânia e Faixa de Gaza têm de ser devolvidas aos palestinos, em obediência a Resoluções do Conselho de Segurança da ONU; e que as colinas ocupadas do Golan têm de ser devolvidas ao povo sírio. Todas essas são demandas legítimas.
O Irã crê firmemente que Israel é regime colonial de apartheid, regime moralmente inaceitável na forma que tem hoje. Assim sendo, pelo menos oficialmente, há diferenças substanciais. Por isso, as pessoas conseguem interpretam de diferentes modos o Eixo da Resistência. Apesar da Síria, é importante ter em mente que Irã, Turquia e Qatar também estão em movimento de aproximação, parcialmente graças à hostilidade de EUA, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos contra a Fraternidade Muçulmana.
O que interessa é que há consenso crescente em torno de questões chaves nessa região e na definição de quais são os maiores problemas. E acho que, conforme passe o tempo, os movimentos tornar-se-ão mais influentes e mais poderosos. Não posso dizer se será tratado formal ou aberto de segurança coletiva, ou aliança militar, a ser criados por esses países em futuro próximo, nem vejo qualquer necessidade desses encaminhamentos. Contudo, entendo que essa convergência de ideias é muito importante. Acho que os laços formais e informais que existem entre esses países são, de vários modos, mais importantes e mais significativos que alianças formais políticas ou militares, ou tratados de segurança.
The Saker: Em meses recentes, muitos observadores afirmaram que Rússia e Israel estariam trabalhando lado a lado, e alguns disseram até que Putin seria basicamente peão do jogo de Netanyahu, e que a Rússia seria leal a interesses de Israel e dos sionistas. O senhor concorda com esse ponto de vista? Como os altos funcionários do Irã veem os contatos entre russos e israelenses? Essa aproximação os preocupa? Ou creem que esses contatos possam ser benéficos para o futuro da região?
Professor Marandi: Completo nonsense. Os governos de EUA e Israel são ligados entre eles, culturalmente e ideologicamente; e os norte-americanos cultivam profunda antipatia contra os russos. Essa é a razão pela qual a posição dos russos quanto à Síria é muito diferente da posição de norte-americanos e israelenses. Israelenses, EUA, União Europeia, sauditas e alguns dos países vizinhos da Síria apoiaram o ISIS, a Al-Qaeda e outras entidades extremistas, e fizeram de tudo para dividir a Síria. Como já explicamos, a visão dos russos sobre Israel é diferente da visão do Irã.
Há muitos russos imigrantes judeus em Israel; são parte muito considerável da população de colonos que ocupam a Palestina, e são amplamente instrumentalizados para aprofundar a subjugação do povo palestino e a ‘limpeza’ étnica. Dito em termos gerais, os interesses russos estão em agudo conflito com os interesses dos EUA, que são o mais forte aliado de Israel.
Além disso, a relação estreita entre Rússia e Síria data dos idos da Guerra Fria; e a incansável pressão dos EUA sobre China e Rússia também age como forte catalisador para acelerar a convergência de um país em direção ao outro, e também na direção do Irã em questões chaves.
Chineses e russos sabem muito bem que os EUA, os europeus e países regionais usaram extremistas na Síria para minar o estado; essas mesmas forças podem ser usadas mais tarde para minar a segurança na Ásia Central, Rússia e China. Grande número de russos, chineses e centro-asiáticos foram treinados para combater na Síria, e essa é grave ameaça à segurança coletiva. Os EUA podem usar esses e outros extremistas, em esforço para impedir o sucesso potencial da Iniciativa Cinturão e Estrada ou outros planos para integração asiática. Assim se vê que o conflito entre russos e norte-americanos é conflito agudo e crescente.
O regime israelense diz aos russos e aos chineses que Israel seria via de acesso até Washington e que, se mantiverem laços fortes com Israel, os israelenses poderão ajudá-los a resolver os problemas que os separam dos EUA. Não creio que haja dose confiável de verdade nisso, porque o conflito crescente tem a ver com o destino da dominância global pelos EUA; e não há o que os israelenses possam fazer para mudar isso. Mesmo assim esse ‘argumento’ tem sido usado como incentivo para que russos e chineses cuidem de preservar suas relações com o regime israelense.
Em qualquer caso, a Rússia não precisa manter visões idênticas às de Irã, Síria, Hezbollah, Líbano, Iraque ou Iêmen. Há diferenças, mas mesmo assim há relações muito fortes que se mantêm. Todos esses países reconhecem que, se os EUA conseguirem minar qualquer deles, seja Síria, Irã, Rússia ou China, esse resultado só encorajará os EUA a serem cada vez mais agressivos contra os demais países que se oponham aos objetivos da política exterior dos EUA ou que lá estejam como rivais potenciais, seja regionalmente ou globalmente. Assim sendo, ainda que as estruturas políticas sejam diferentes, ainda que as várias políticas externas sejam diversas, as semelhanças que mesmo assim se mantêm têm muito peso, tanto quanto as ameaças que todos esses países enfrentam. Mais uma vez: em grande medida, essa coalizão é resultado da política externa dos EUA e do ocidente em geral, que ainda se alimenta de fortes correntes subterrâneas de eurocentrismo, tribalismo e racismo.
Essa pressão fez com que esses países e esses movimentos se aproximassem uns dos outros e, mais importante que a proximidade, gerou compreensão mais profunda entre eles. Hoje, os russos conhecem e compreendem o Irã mais e melhor do que conheciam e compreendiam há cinco anos – efeito, em parte, da cooperação entre russos e iranianos na Síria. Nesse caso, a maior compreensão aprofunda o relacionamento e ajuda a dissipar muitas das incompreensões e muitos dos mitos que cada lado cultivasse em relação ao outro, ainda por efeito de narrativas eurocêntricas e do orientalismo.
Assim se compreende que o Irã não se preocupe com a relação entre russos e israelenses. Obviamente, num mundo ideal, o Irã talvez apreciasse que a Rússia rompesse relações com o regime israelense, por sua natureza de regime de apartheid. Mas a realidade é a realidade, e as relações dos iranianos com a Rússia são excelentes, e tenho certeza de que, vez ou outra, os iranianos servem-se dos russos para enviar ‘avisos’ aos israelenses.
The Saker: Como a Rússia é vista no Irã? Ainda há muitos iranianos que desconfiam da Rússia, ou a maioria dos iranianos acredita que tenham, na Rússia, um parceiro viável e honesto? Quais as principais preocupações e reservas que se encontram entre iranianos patriotas, quando pensam na Rússia?
Professor Marandi: Historicamente, os iranianos tiveram problemas sérios com os russos. Os russos e a União Soviética intervieram extensamente em assuntos internos do Irã, e agrediram a soberania iraniana. Mas desde o colapso da União Soviética, a imagem da Rússia mudou. Especialmente desde que a Rússia passou a combater ao lado do Irã na Síria, em 2015, a imagem da Rússia melhorou significativamente. Se se examinam as pesquisas, a imagem da Rússia é muito positiva, comparada a dos países ocidentais.
Governos ocidentais são proprietários diretos ou financiam dúzias de veículos de mídia em idioma persa. Esses veículos, como a Voz da América, e a BBC em persa, dentre outros, só fazem repetir propaganda anti-Rússia. Obviamente, isso tem algum impacto, que se soma às preocupações históricas que a Rússia sempre inspirou aos iranianos. Mas ainda assim a imagem dos russos é hoje relativamente favorável, o que não é dizer pouco.
The Saker: E quanto à Turquia? Irã e Turquia mantiveram relação complexa no passado, mesmo assim, no caso da guerra anglo-sionista contra a Síria, os dois estados trabalharam juntos (e com a Rússia). – Parece-lhe que isso signifique que a Turquia esteja sendo vista no Irã como parceira viável e honesta?
Professor Marandi: O relacionamento do Irã com o governo turco é complicado, especialmente por causa das muitas mudanças políticas que ocorreram na Turquia em anos recentes – o que fez o governo parecer pouco confiável aos olhos de muitos. Isso posto, a Turquia é muito diferente dos regimes influenciados pelos wahhabistas na Península Árabe. A tradição islâmica turca guarda semelhanças notáveis com a cultura islâmica iraniana e, graças à sua forte tradição sufista, a Turquia está muito mais perto do Irã do que, por exemplo, da Arábia Saudita wahhabista.
A ameaça wahhabista global cresceu como resultado do apoio financeiro dado pelos sauditas, e do apoio em geral de outros países na região do Golfo Persa. A sociedade turca foi mais resistente. Mas desde o conflito militar na Síria e dado o forte financiamento recebido do Golfo Persa, tem havido preocupação crescente quanto a um sectarismo crescente na Turquia, não muito diferente do que aconteceu no Paquistão nos anos 1980s.
Ironicamente, antes do conflito na Síria o presidente Erdogan mantinha relação pessoal muito mais próxima com o presidente Assad, do que os iranianos. Várias vezes as duas famílias passaram férias juntas.
Seja como for, a Turquia tem um relacionamento econômico, político e cultural muito forte com o Irã, e parte dos crescentes sentimentos antixiitas e de takfirismo que brotaram na Turquia foram estimulados pelo apoio que os sauditas e os emirados deram à tentativa de golpe na Turquia. Subsequentemente, o aberto antagonismo dos sauditas e emirados contra a Fraternidade Muçulmana e o Qatar; o apoio que deram ao golpe no Egito; suas políticas no Sudão e na Líbia e, claro, o assassinato de Jamal Khashoggi, contribuíram para facilitar as relações Irã-Turquia. Resultado disso, a Turquia foi-se posicionando numa maior distância dos antagonistas regionais do Irã. O apoio que os turcos dão à causa palestina é outro elemento que aproxima cada vez mais Irã e Turquia.
O apoio que os EUA dão aos terroristas do PKK na Síria também enfureceu os turcos, acrescentando novo impulso à convergência turco-iraniana. Até a política turca para a Síria está evoluindo, embora seja impossível para o governo fazer qualquer mudança radical, por causa de anos de esforços golpistas para promover mudança de regime.
The Saker: Agora, passando para o Iraque: como o senhor caracterizaria o “balanço das influências” de Irã e EUA no Iraque? Deve-se ver o governo do Iraque como aliado do Irã, como aliado dos EUA ou independente? Se o Império atacar o Irã, o que acontecerá no Iraque?
Professor Marandi: O relacionamento entre Iraque e Irã é significativamente mais importante que o relacionamento entre Iraque e EUA. Irã e Iraque são aliados, mas essa aliança em nada contradiz a noção da independência iraquiana. A política regional do Iraque não é idêntica à do Irã. Mas os dois países têm interesses muito similares; relacionamento muito próximo; muitos líderes iraquianos passaram anos no Irã, e a maioria da população do Iraque vive próxima da fronteira partilhada entre os dois países, por mais de 1.200 km. Comércio, peregrinações e turismo são atividades chave para os dois países. As semelhanças religiosas e os sítios religiosos que existem no Irã e Iraque são grande incentivo para a interação entre os dois países. Há muitos iraquianos que estudam no Irã, e muitos iranianos que trabalham no Iraque. O fato de que os iranianos fizeram muitos sacrifícios na luta contra o ISIS e a Al-Qaeda na Síria é forte indicação de como estão as coisas, apesar da pressão que fazem os EUA.
A peregrinação Arba’een realizada todos os anos, momento em que milhões de iranianos e iraquianos caminham até Karbala, lado a lado, com dezenas de milhares de voluntários iraquianos e iranianos que auxiliam os peregrinos ao longo do caminho, é, penso eu, mais um sinal eloquente desse relacionamento próximo.
Apesar de a presença dos EUA no Iraque continuar a ser hegemônica, o Irã nada fez para impedir que o Iraque tenha relações normais com outros países. Os EUA contudo continuam a tentar controlar o Iraque (mantêm lá a maior embaixada do mundo, presença militar e forte influência sobre a burocracia). Os EUA continuam a ter pesada influência sobre o modo como é gasta a riqueza gerada pelo petróleo iraquiano.
Mesmo assim, apesar do comportamento colonialista dos EUA, do assalto continuado à riqueza gerada pelo petróleo iraquiano e do comportamento bandido, ainda assim os iraquianos têm conseguido assegurar para si boa dose de independência.
No longo prazo, esse continuado comportamento dos EUA só criará cada vez maior ressentimento entre os iraquianos. O império raramente leva em consideração essas realidades. Forças imperialistas só buscam acumular riqueza e capacidade para influenciar o estado mediante a força bruta – atitude que, no longo termo cria ira e hostilidade profundamente enraizadas as quais, em algum momento, criarão graves problemas para o império, especialmente porque ira e agitação crescem e alastram-se pela região, se não já por todo o globo.
É altamente improvável que o regime em Washington ataque o Irã. Se o fizer, criará uma guerra regional, a qual expulsará os EUA para bem longe de Iraque, Afeganistão, Líbano e Síria. A Arábia Saudita e os Emirados rapidamente entrarão em colapso e o preço do petróleo e do gás natural chegará à estratosfera, o que levará a economia global ao caos, com milhões de pessoas tentando chegar à Europa.
The Saker: Diz-se com frequência que Rússia e Irã têm objetivos fundamentalmente diferentes na Síria e que os dois países continuam a enfrentar tensões fortíssimas entre eles, por causa desses desacordos. É verdade? Em sua opinião, em que diferem os objetivos de russos e iranianos na Síria?
Professor Marandi: Notícias que se ouvem às vezes sobre graves tensões que haveria entre iranianos e russos na Síria são quase sempre nonsense. Há razões conhecidas para que as pessoas exagerem pequenos incidentes, ou inventem completamente eventos que jamais aconteceram, mas o relacionamento é muito bom. O Irã absolutamente não planeja construir bases militares na Síria, e os russos sentem a necessidade de preservar a própria presença militar na síria mediante acordos de longo prazo.
O Irã gostaria de capacitar a Síria para obter capacidade militar para retomar as colinas do Golan ocupadas por Israel. Mas o Irã não tem intenções de iniciar qualquer conflito com o regime israelense dentro da Palestina. Não é objetivo no Líbano, como tampouco é objetivo na Síria.
Como no Líbano, onde os iranianos apoiaram o Hezbollah para restaurar a soberania libanesa e expulsar de lá os agressores e ocupantes israelenses, assim também os iranianos têm agenda equivalente na Síria. Querem apoiar os sírios, de modo a que tenham capacidade para restaurar sua plena soberania. Não creio que as colinas do Golan sejam prioridade para os russos.
The Saker: Por algum tempo, o Irã permitiu que as Forças Aeroespaciais Russas usassem um campo militar de pouso; depois, quando a notícias espalhou-se, os russos foram convidados a sair. Ouvi rumores segundo os quais só o Corpo de Guardas da Revolução Islâmica (CGRI, ing. IRGC) teria sido favorável a permitir que as Forças Aeroespaciais Russas usassem aquela pista militar de pouso; e que as forças regulares opunham-se à permissão. É verdade que há diferenças desse tipo entre o CGRI e as forças armadas regulares iranianas? O senhor crê que o Irã algum dia permitirá que os russos estabeleçam presença militar permanente no Irã?
Professor Marandi: Tudo isso é mito. Os russos não foram convidados a sair do Irã. Não há diferenças entre o CGRI qualquer outra parte das forças armadas iranianas. A decisão foi tomada pelo Conselho Supremo de Segurança Nacional e o presidente e todos os altos comandantes militares participaram dessa decisão. Na verdade, a base aérea não pertence ao CGRI, mas à força aérea; uma parte da base foi usada por bombardeiros estratégicos russos que voavam para a Síria para atacar extremistas. A cooperação terminou quando os russos puderam alocar número adequado de aeronaves na Síria, porque os voos sobre o Irã eram longos e caros, enquanto a campanha aérea a partir de bases dentro da Síria era muito menos cara e muito mais efetiva. O Irã foi muito aberto e explícito sobre o relacionamento que o país mantinha com os russos, e permitiram abertamente que os russos disparassem mísseis que cruzavam o espaço aéreo iraniano.
Houve oposição à presença de russos na base aérea iraniana. Um pequeno segmento da sociedade iraniana, dos que são pró-ocidente e pró-EUA, muito protestou em veículos da mídia contra aquela base, mas esse protesto não teve absolutamente impacto algum no processo de tomada de decisões. Segundo pesquisas, maioria muito ampla da população iraniana aprovava as atividades na Síria; e o Conselho Supremo de Segurança Nacional absolutamente não estava sob pressão, ao tomar aquela decisão. Mas o Irã não tem planos de permitir que qualquer país tenha bases permanentes em território iraniano, e isso está conforme com a Constituição da República Islâmica do Irã.
A revolução no Irã foi um projeto de independência, dignidade, soberania e valores indígenas; e pôr fim à hegemonia dos EUA sobre o Irã foi parte importante daquele projeto. Os iranianos não cederão bases a potências estrangeiras, e nem russos nem chineses jamais apresentaram tais demandas. Absolutamente não há diferenças quanto a políticas regionais do Irã entre o CGRI e os demais militares; e todos participaram do processo de tomada de decisões que autorizou os russos a disparar mísseis que sobrevoavam território iraniano; e todos participaram do processo que levou à autorização para que a aviação russa usasse o espaço aéreo do Irã. Os russos estavam dando apoio aéreo a tropas iranianas e a grupos aliados do Irã que combatiam em terra.
The Saker: Ambos, o aiatolá Ali Khamenei e o secretário-geral do Hezbollah Hassan Nasrallah, repetiram em várias falas e declarações, que estão contados os dias do regime racista-sionista de apartheid nos territórios ocupados. O senhor concorda com esse ponto de vista? E, se concorda, como o senhor prevê que aconteça essa mudança de regime? Na sua avaliação, que solução – de Um Estado, ou de Dois Estados – é a mais realista?
Professor Marandi: Não acredito que a solução de Dois Estados seja possível, porque o regime israelense já colonizou área grande demais, na Cisjordânia. Na verdade, com seus atos de egoísmo e visão miseravelmente caolha, o regime israelense causou terrível dano a si mesmo. Como resultado da colonização da Cisjordânia, até diplomatas e elites europeias já admitem privadamente que as políticas implantadas pelo regime de Israel são políticas de apartheid. Até quem acalenta esperanças de que se alcance uma solução de dois estados já admite que essa ideia está morta. Todos os palestinos são tratados como subumanos, residam na Cisjordânia ou não. São nação subjugada, sejam cidadãos israelenses ou não. E absolutamente já não há qualquer esperança de que os que vivem na Cisjordânia voltem a recuperar a liberdade que perderam; já previmos que os israelenses jamais entregarão voluntariamente a Cisjordânia ocupada.
Esse é o mais importante desafio que o regime sionista de Israel enfrenta hoje e para o futuro. Ao colonizar a Cisjordânia – e digam o que disserem as narrativas governamentais e oficiais ocidentais –, Israel deixa-se ver aos olhos da comunidade internacional como o regime de apartheid que é. Israel está-se deslegitimando aos olhos de grande número de pessoas.
Além disso, Israel já não consegue agir impunemente. A guerra de 2006 no Líbano, na qual o Hizbullah derrotou as forças armadas israelenses foi um ponto de virada. Antes daquela derrota, os israelenses haviam criado e conseguiam ainda manter a fantasia de que seriam invencíveis. Hoje, nem em Gaza conseguem impor a própria vontade e alcançar seus objetivos políticos, quando atacam de tempos em tempos os territórios ocupados e as populações civis que ali vivem.
Hoje é muito mais fácil conter os israelenses sionistas, especialmente desde que o governo sírio conseguiu restaurar a ordem e expulsar ISIS e al-Qaeda das áreas próximas dos setores ocupados por forças de Israel nas colinas do Golan – apesar do apoio que os extremistas recebem do estado de Israel.
A Israel sionista foi contida regionalmente; e até entre israelenses os sionistas são vistos como regime de apartheid. E seus aliados regionais também estão em declínio na região. Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos são os únicos países que podem ser considerados aliados efetivos dos sionistas israelenses; e todos esses estados enfrentam crise de declínio terminal.
Tudo isso considerado, vê-se que o regime israelense vai-se tornando cada vez mais isolado; não creio que consiga durar ainda muito tempo nessas circunstâncias. Assim como o regime deapartheid na África do Sul colapsou sob o peso da própria existência imoral, assim também sucumbirá o regime sionista de Israel. Não pode ser diferente.
Não haverá solução de Dois Estados. A única solução realista e moral é a Palestina ser reunificada, e restaurados todos os direitos da população nativa, sejam palestinos, judeus ou cristão ou o que mais sejam os legítimos proprietários indígenas da terra.
The Saker: O Irã é República Islâmica. Também é país de maioria xiita. Alguns observadores acusam o Irã de desejar exportar o próprio modelo político para outros países. O que o senhor pensa dessa acusação? Os intelectuais islâmicos iranianos acreditam que seja possível exportar para outros países, inclusive para países sunitas, o modelo da República Islâmica do Irã?
Professor Marandi: Não me parece que haja qualquer validade nessa acusação. O Irã tem relacionamento absolutamente excelente com o Iraque, e nem por isso impôs o próprio modelo aos iraquianos. De fato, o Irã ajudou a criar a Constituição que atualmente rege o Iraque. O mesmo vale para Líbano e Iêmen.
O Irã é frequentemente acusado por seus antagonistas, mas as acusações são sempre inconsistentes. Frequentemente dizem que o Irã teria medo de o ‘outro’ modelo ser exportado, porque os iranianos temeriam qualquer rival. O Irã sempre foi atacado por todos os lados, com frequência mediante argumentos que se contradizem entre eles. Por um lado, dizem que o chamado regime seria imensamente impopular, corrupto, estaria caindo aos pedaços e seria incapaz até de impor a própria autoridade interna. Por outro lado, o Irã seria ameaça sempre crescente a toda a região e ao mundo. É paradoxal: como o Irã poderia ser incompetente e estar à beira do colapso e, ao mesmo tempo, ser tão terrível ameaça sempre crescente contra todo o planeta? Nada aí faz qualquer sentido.
Seja como for, jamais vi qualquer sinal de que o Irã tenha tentado impor o próprio modelo a outros países ou a movimentos muito próximos dos iranianos. Não fosse o apoio do Irã, ISIS e al-Qaeda teriam destruído a Síria com seu governo secular e sua Constituição secular. Os iranianos creem firmemente que as forças terroristas apoiadas pelos serviços ocidentais de inteligência e por regimes regionais sempre seriam o pior cenário possível para o povo sírio. Nem por isso impuseram o próprio modelo.
The Saker: Muito obrigado por responder nossas perguntas!*******
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