Israel usa Fósforo branco em Gaza e no Líbano

Human Rights Watch – 12 de outubro de 2023

Nota da tradutora: Até mesmo a Human Rights Watch admite, após investigação própria, o uso do fósforo branco por Israel em Gaza e no Líbano, constituindo mais um crime de guerra por parte do governo israelense. Essa substância atinge elevadas temperaturas e queima tudo à sua volta, incluindo solo, metais e da pele humana aos ossos. 

O uso em áreas povoadas representa graves riscos para os civis.

Explosões aéreas de fósforo branco disparado por artilharia caem sobre o porto da cidade de Gaza, 11 de outubro de 2023. © 2023 Mohammed Adeb/AFP via Getty Images

(Beirute, 12 de outubro de 2023) – O uso de fósforo branco por Israel em operações militares em Gaza e no Líbano coloca os civis em risco de ferimentos graves e de longo prazo, afirmou hoje a Human Rights Watch ao divulgar um documento de perguntas e respostas sobre o fósforo branco. A Human Rights Watch verificou vídeos feitos no Líbano e em Gaza em 10 e 11 de outubro de 2023, respectivamente, mostrando múltiplas explosões aéreas de fósforo branco disparado por artilharia sobre o porto da Cidade de Gaza e duas localidades rurais ao longo da fronteira Israel-Líbano, e entrevistou duas pessoas que descreveram um ataque em Gaza.

O fósforo branco, que pode ser usado para marcação, sinalização e obscurecimento, ou como arma para provocar incêndios que queimam pessoas e objetos, tem um efeito incendiário significativo que pode queimar gravemente pessoas e colocar estruturas, campos e outros objetos civis nas proximidades em chamas. A utilização de fósforo branco em Gaza, uma das áreas mais densamente povoadas do mundo, aumenta o risco para os civis e viola a proibição do Direito Humanitário Internacional de colocar os civis em riscos desnecessários.

“Sempre que o fósforo branco é usado em áreas civis lotadas, representa um elevado risco de queimaduras excruciantes e sofrimento para toda a vida”, disse Lama Fakih, diretor do Oriente Médio e Norte de África da Human Rights Watch. “O fósforo branco é ilegalmente indiscriminado quando explode em áreas urbanas povoadas, onde pode incendiar casas e causar danos flagrantes a civis.”

No dia 11 de outubro, a Human Rights Watch entrevistou por telefone duas pessoas da zona de al-Mina, na Cidade de Gaza, que descreveram ter observado ataques consistentes com a utilização de fósforo branco. Uma delas estava na rua naquele momento, enquanto a outra estava em um prédio comercial próximo. Ambas descreveram ataques aéreos contínuos antes de verem explosões no céu seguidas pelo que descreveram como linhas brancas indo em direção à terra. Elas estimaram que o ataque ocorreu entre 11h30 e 13h. Ambas disseram que o cheiro era sufocante. A pessoa que estava em seu escritório disse que o cheiro era tão forte que foi até à janela ver o que estava acontecendo e filmou o ataque.

A Human Rights Watch analisou o vídeo e verificou que foi filmado no porto da Cidade de Gaza e identificou que as munições utilizadas no ataque eram projéteis de artilharia de fósforo branco de 155 mm de explosão aérea. Outros vídeos postados nas redes sociais e verificados pela Human Rights Watch mostram o mesmo local. A fumaça branca densa e o cheiro de alho são características do fósforo branco.

A Human Rights Watch também analisou dois vídeos de 10 de outubro de dois locais próximos à fronteira entre Israel e Líbano. Cada um mostra projéteis de artilharia de fósforo branco de 155 mm sendo usados, aparentemente como cortinas de fumaça, marcação ou sinalização.

O fósforo branco inflama quando exposto ao oxigênio atmosférico e continua a queimar até ser privado de oxigênio ou esgotado. Sua reação química pode criar calor intenso (cerca de 815°C/1.500°F), luz e fumaça.

Ao entrar em contato, o fósforo branco pode queimar as pessoas, térmica e quimicamente, até os ossos, pois é altamente solúvel em gordura e, portanto, na carne humana. Fragmentos de fósforo branco podem agravar feridas mesmo após o tratamento e podem entrar na corrente sanguínea e causar falência de múltiplos órgãos. Feridas já tratadas podem reacender quando os curativos são removidos e as feridas são expostas novamente ao oxigênio. Mesmo queimaduras relativamente pequenas são frequentemente fatais. Para os sobreviventes, cicatrizes extensas tensionam o tecido muscular e criam deficiências físicas. O trauma do ataque, o tratamento doloroso que se segue e as cicatrizes que alteram a aparência levam a danos psicológicos e à exclusão social.

A utilização de fósforo branco em áreas densamente povoadas de Gaza viola o requisito do Direito Humanitário Internacional de tomar todas as precauções possíveis para evitar ferimentos em civis e perda de vidas, afirmou a Human Rights Watch. Esta preocupação é amplificada dada a técnica evidenciada em vídeos de projéteis de fósforo branco explodindo no ar. A explosão aérea de projéteis de fósforo branco espalha 116 cunhas de feltro em chamas impregnadas na substância sobre uma área entre 125 e 250 metros de diâmetro, dependendo da altitude da explosão, expondo assim mais civis e estruturas civis a danos potenciais do que uma explosão localizada no solo.

As autoridades israelenses não comentaram se usaram ou não fósforo branco durante os combates em curso.

A utilização de fósforo branco por Israel ocorreram após aos ataques mortais do Hamas em 07 de outubro e aos subsequentes ataques de foguetes que mataram, até 12 de outubro, mais de 1.300 israelenses, incluindo centenas de civis, e tomaram dezenas de israelenses como reféns, em violação da lei humanitária internacional. O pesado bombardeamento israelita de Gaza neste período matou, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, mais de 1.400 palestinianos em Gaza, incluindo dezenas de civis, e deslocou mais de 338.000 pessoas. Muitas comunidades no sul de Israel também foram deslocadas e mais de 1.500 militantes palestinos teriam morrido em Israel. As autoridades israelitas cortaram a eletricidade, a água, o combustível e os alimentos em Gaza, em violação da proibição do Direito Humanitário Internacional contra a punição coletiva, exacerbando a terrível situação humanitária de mais de 16 anos de encarceramento israelita.

A Human Rights Watch documentou o uso de fósforo branco pelos militares israelenses em conflitos anteriores em Gaza, inclusive em 2009. Israel deveria proibir todo o uso de munições de fósforo branco de “explosão aérea” em áreas povoadas, sem exceção. Existem alternativas prontamente disponíveis e não letais às bombas de fumo de fósforo branco, incluindo algumas produzidas por empresas israelitas, que o exército israelita utilizou no passado como obscurador para as suas forças. Estas alternativas têm o mesmo efeito e reduzem drasticamente os danos aos civis.

Em 2013, em resposta a uma petição ao Supremo Tribunal de Justiça de Israel sobre a utilização de fósforo branco em Gaza, os militares israelitas declararam que deixariam de utilizar fósforo branco em áreas povoadas, exceto em duas situações restritas que revelaram apenas aos juízes. Na decisão do tribunal, a juíza Edna Arbel afirmou que as condições “tornariam o uso de fósforo branco uma exceção extrema em circunstâncias altamente particulares”. Embora esta decisão não representasse uma mudança oficial na política, a Juiza Arbel apelou aos militares israelitas para realizarem um “exame completo e abrangente” e adotarem uma diretiva militar permanente.

Os ataques com armas incendiárias lançadas por via aérea em áreas civis são proibidos pelo Protocolo III da Convenção sobre Armas Convencionais (CCW). Embora o protocolo contenha restrições mais fracas para armas incendiárias lançadas no solo, todos os tipos de armas incendiárias produzem ferimentos horríveis. O Protocolo III aplica-se apenas a armas “projetadas principalmente” para provocar incêndios ou causar queimaduras e, portanto, alguns países acreditam que exclui certas munições polivalentes com efeitos incendiários, nomeadamente aquelas que contêm fósforo branco.

A Human Rights Watch e muitos Estados há muito que apelam à colmatação destas lacunas no Protocolo III. Estes ataques deverão dar ímpeto aos apelos de pelo menos duas dezenas de países para que a Reunião dos Estados Partes da CCAC reserve tempo para discutir a adequação do Protocolo III. A próxima reunião está marcada para novembro, nas Nações Unidas, em Genebra.

A Palestina aderiu ao Protocolo III em 05 de janeiro de 2015, e o Líbano em 05 de abril de 2017, enquanto Israel não o ratificou.

“Para evitar danos aos civis, Israel deveria parar de usar fósforo branco em áreas povoadas”, disse Fakih. “As partes em conflito deveriam fazer tudo o que puderem para poupar os civis de mais sofrimento.”


Fonte: https://www.hrw.org/news/2023/10/12/israel-white-fosforus-used-gaza-lebanon


One Comment

  1. Gilmar said:

    Quando uma regra é claramente transgredida e o agressor segue na história impune, é hora de se questionar a validade, poder, sanidade mental ou escárnio de quem definiu ou acordou com essas regras.

    Vimos no Brasil a desmoralização de todas instituições democráticas pós 2013. Continua acreditando em direitos e cidadania apenas os tolos. E isso vale pra mundo todo.

    A força bruta é o verdadeiro direito natural. Cabe ao mais fraco o juizo.

    Numa sociedade da pilula vermelha (ciente que a ONU é um cabide de empregos), mais valia ter comprado comida e dado aos pobres, fazendo bom uso do dinheiro desperdiçado em salários, viagens e estadias, pra produzir aquela “proposta de paz” na miragem de orgão mundial em favor das “nações”.

    Quem entende a semântica de “nações”, sabe que o escárnio já começou na sigla.

    A ONU, “Human Rights” et al, são divagações ilusórias da democracia.

    Transgredir, já virou o normal. Alguem se lembra dos 3.000 (200 bombeiros em serviço) do 911 mossadiano?

    Off topic: o Greenpeace não vai se manifestar contra Israel por eles estarem contribuido com as emissões de carbono, fosforo, metano e outros contaminantes?

    21 October, 2023
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