Cronicas do colapso: O derretimento da democracia liberal ocidental

Quantum Bird – 8 de julho de 20240705

“O Ocidente conquistou o mundo não pela superioridade de suas ideias, valores ou religião (aos quais poucos membros de outras civilizações foram convertidos), mas sim por sua superioridade na aplicação da violência organizada. Os ocidentais frequentemente se esquecem desse fato; os não ocidentais nunca se esquecem.”

Samuel P. Huntington, The Clash of Civilizations and the Remaking of World Order (1996)

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Conquistar corações e mentes indefesos sob a mira de uma pistola é relativamente fácil. Além disso, existe sempre uma parcela da sociedade nativa que sofre de variados níveis de complexo de inferioridade misturados com altas doses de viralatismo, que fica excitada para servir ao poder imperial do momento – prostituição seria o termo mais adequado. Pois, como sabemos bem, e de qualquer forma, os árabes palestinos não nos deixam esquecer, territórios podem apenas ser ocupados, mas a colonização acontece mesmo é nas mentes dos colonizados.

Depois de 500 anos de perturbação no ultramar, e 250 de violência em escala industrial, a era do almoço livre para o Ocidente Coletivo acabou. As potencias telúricas do Sul Global estudaram o modelo de agressão ocidental e o tornaram inefetivo. A incapacidade do Ocidente Coletivo de se adequar a esta nova realidade e sua insistência nos velhos hábitos – revoluções coloridas, sansões econômicas, guerras por procuração, e mais recentemente, assassinatos via drones — colocaram a desdolaziração na ordem do dia. O wokeismo (identitarismo em esteroides) e o apoio ao genocídio da população de Gaza terminaram o trabalho de erodir definitivamente o restante da atratividade da cultura ocidental.

A história é irônica. Nos livros de história redigidos nas próximas décadas, a descrição dos supostos dez anos de domínio unipolar do mundo pelo Ocidente Coletivo será seguida pelas cronicas de sua agonia suicida e declínio final.

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Vejamos o quadro geral:

  • Podemos dizer que em junho de 2024 o principal ator político do Ocidente Coletivo é o seu povo. De fato, a população ocidental deu seu recado em alto e bom som nas ultimas eleições parlamentares na Europa e Reino Unido, onde, em meio à baixíssimos índices de adesão, os poucos que apareceram para votar deixaram claro sua insatisfação com os seus dirigentes e impuseram derrotas eleitorais gráficas aos partidos e coalizões estabelecidas. Ainda assim, não podemos esperar qualquer mudança de curso. Os verdadeiros donos do poder, os 1%, que controlam as marionetes que passam por políticos no Ocidente Coletivo não estão prontos para fazer concessões. Nenhuma novidade. Tradicionalmente, os 1% só fazem concessões sob risco gilhotinamento iminente. Aparentemente, os mesmos 1% estão bem engajados em relembrar o povo sobre isso.
  • A EU acaba de apontar Kaja Kallas como diplomata chefe do bloco. Deixemos de lado por um momento o fato que Kallas não tem qualquer experiencia em diplomacia. Estamos falando de uma racista russofóbica raivosa, que passou boa parte dos últimos anos advogando pela conquista, destruição e desmembramento completo da Federação Russa, a implantação de armas nucleares na Estônia – mini-micro estado pós-soviético no qual ela era primeiro ministro – além de engajar-se em todo tipo de abuso contra a população russófila de seu país. A EU demonstra em cada desenvolvimento, um instinto suicida irresistível. E seja como for, Kallas foi colocada em tal posição pelo voto de quem?
  • Na Ucrânia, a ficha parece ter caído para Zelensky. Ele percebeu que em breve será deixado na com a sacola na mão. Ou seja, irá responder sozinho pela destruição de três exércitos e da perda adicional de território. Ninguém mais ouve falar Boris Jonhson, a OTAN já está trocando de CEO e cada politico que ousou apertar a mão de Zé está sendo removido. Em breve ninguém do Clube do Zé vai estar em atividade. A reação dele está sendo chantagear o Ocidente Coletivo inteiro: Ou a Ucrânia entra para a EU ou a OTAN, ou ele vai assinar o plano de paz com a Rússia.

    O problema é que o mandato presidencial de Zelensky terminou em maio e ele, bem ciente de sua impopularidade, não convocou eleições. Assim, a Rússia não reconhece nem ele nem a Verkhovna Rada como representantes oficiais da Ucrânia. Adicionalmente, o tempo urge para Zelensky, pois o estado de Lei Marcial vigente foi estendido a ultima vez por decreto presidencial ainda durante seu mandato legal e expira em agosto.

Basicamente, agosto pode muito bem marcar o seu fim político, e talvez físico. O Regimento Azov, milicia nazista criada e mantida pelo Ocidente Coletivo, já está sendo ativado para prevenir qualquer surpresa da parte de Zelensky que implique em uma mudança de curso imprevista na Ucrânia. Vai fugir para Rússia Zé?

  • O recém eleito e empossado primeiro-ministro britânico, Kier Starmer, em menos de 24 horas no poder afirmou seu compromisso com a manutenção das hostilidades na Ucrânia. “Até o ultimo ucraniano!” segue sendo o lema no Reino Unido. Ele tem tudo para ser a versão “Labour” de Liz Truss. Quase ninguém apareceu para votar.
  • Sobre os EUA, acredito que a imagem abaixo, retirada de uma reportagem recente do New York Times, resume perfeitamente a situaçã. Me abstenho de comentários adicionais.

A América precisa de um presidente ?

  • Na França, a manobra eleitoral de Macron saiu pela culatra. De acordo com dados do Ministério do Interior, a Nova Frente Popular, de Jean-Luc Melenchon, conquistou 182 assentos, o bloco de Macron, “Juntos”, conquistou 168, e o Rally Nacional, de Marine Le Pen, obtive 143. Ou seja, nenhum dos três principais blocos, que se antagonizam fortemente, está em posição de governar sozinho. O primeiro-ministro disse que renunciará na segunda-feira e não é óbvio quem será o próximo, pois qualquer um escolhido por Macron deverá enfrentar um voto de confiança no parlamento. Não é aconselhável passear por Paris se a Nova Frente Popular se fragmentar para apoiar Macron. Por outro lado, olhando de longe, os programas de bloco liderado por Le Pen e Melenchon são mais compatíveis entre si do que com a plataforma de Macron, focada nas hostilidades contra a Rússia, mas as propostas da Nova Frente Popular e do Rally Nacional são absoluto anatéma para liderança da EU.
    Historicamente, um presidente fraco (sem maioria no parlamento) não pode governar a França, e o lógico seria Macron renunciar. Mas ele não vai fazer isso… ou vai?

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Em suma, esta é a democracia liberal, baseada em anomia massiva e autoritarismo seletivo, que elege lideres impopulares, não representativos, e gera sociedades ingovernáveis e desgovernadas. O dano que criado é agora irreversível e a única questão é se conseguiremos superar esse momento histórico sem uma grande guerra. Esse é o desejo dos 1%, uma grande guerra, felizmente não compartilhado pelo 75% do planeta que floresce fora do ocidente decadente.

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