Paulino Cardoso(*) – 11 de junho de 2024
Os brados desesperados das esquerdas, ou quem sabe, progressistas brasileiros, só não é maior que o da Globo e de toda mídia corporativa internacional. O chororô é tanto que o jornalista e editor internacional do site Brasil 247, José Reinaldo Carvalho¹, foi obrigado a escrever uma coluna recente alertando para o fato que o crescimento dos partidos de extrema direita, não implica necessariamente em uma frente ampla sob liderança da direita liberal, também conhecida como direita cheirosa.
Em primeiro lugar, a surra, principalmente na Alemanha de Olaf “salsicha de fígado” Sholz e Emmanuel Macron, vulgo Napoleão III, era mais que esperada por conta de suas políticas belicistas que ameaçam levar a Europa a uma confrontação direta com a Federação Russa. No caso da Alemanha, a submissão do país ao Império estadunidense, levou a nação a uma gigantesca crise econômica com o fechamento de negócios e saída de empresas para os EUA e outros, devido à perda do gás russo barato. A política dos Verdes, retirou subsídios aos agricultores, levou ao fechamento das usinas nucleares germânicas. Já, Macron, funcionário dos Rothschild, preside um governo profundamente impopular, violento com as manifestações populares e comprometido com a banca e pouco com os franceses.
Combine isso com uma esquerda, com raras exceções, derrotista que desde os anos 1990, deixou de mão as pautas trabalhistas, anti-imperialistas, para abraçar a agenda woke estadunidense e suas pautas identitárias. Incapaz de viabilizar um discurso anti-sistema, abriu espaço lá, assim como no Brasil e Argentina, ao crescimento da chamada extrema direita que foi capaz de captar o sentimento de insatisfação popular.
O problema é que, como vimos na Itália da primeira-ministra Giorgia Meloni, o voto de protesto dos populares europeus, não irá significar uma mudança importante nas suas vidas. A Europa continuará caminhando a passos largos para insignificância geopolítica e geoeconômica, um penhasco estéril no extremo-oeste da Ásia, como o era a duzentos antes de tomar consciência de si mesma.
Do ponto de vista do Sul Global, quanto mais em crise , um clima de guerra civil imperarem no Atlântico Norte, melhor para nós, pois o bem estar de lá deveu-se a colonização do Leste Europeu (perceberam a distribuição geográfica dos votos na Alemanha?) e do neocolonialismo mais descarado de África, Ásia e América Latina. Não é de estranhar o compromisso do Ocidente Coletivo com a entidade sionista e genocida na Ásia Ocidental.
Essa sensibilidade extrema com o destino da Europa, também revela o profundo viralatismo de uma esquerda que não se importa com a prisão infinita do presidente Pedro Castilho no Peru. É crítica dos governos de Nicarágua, Venezuela e Cuba. Não entende a importância geopolítica e anti-imperialista de Irã, Rússia, China e Coreia Popular. Não são contrárias às administrações de Laos, Camboja e Vietnã, porque teriam dificuldades de apontá-los no mapa.
Ciosas de seus ancestrais europeus e de sua formação em Portugal, Espanha, Alemanha, Bélgica e, não podia faltar na lista, a França da Sorbonne, essa gente ainda acredita que a Europa ocidental é o centro do mundo e o coração da dita comunidade internacional. Como bem denunciou Breno Altman, o silêncio dos intelectuais e das universidades brasileiras acerca do genocídio palestino é fruto do medo de perder seus financiamentos internacionais, em especial, alemão.²
Uma esquerda comprometida com “um outro mundo é possível” deveria estar atenta aos movimentos incríveis no país ditos em desenvolvimento. Árabia Saudita, depois de normalizar suas relações com o Irã, enterrou de vez o petrodólares ao negociar em moedas nacionais, inclusive com a China. Se prestarem atenção à estrutura de conexão global, intermodal, capitaneada por China, Irã, Rússia, verão que a velha Ásia volta para o lugar que possuía há milênios: ser o centro do mundo e de encontro de civilizações.
(*) Paulino Cardoso é historiador, analista geopolítico e editor do Blog Mundo Multipolar
2.Breno Altman. Quais as razões da apatia na esquerda sobre a questão Palestina?
Eu gostaria em primeiro lugar de esclarecer uma certa confusão que parece reinar persistentemente em torno dos conceitos de “esquerda” e “direita”. O próprio autor da peça em apreço parece não saber muito bem o que isso é, considera “de esquerda” partidos que de maneira alguma o são, e portanto não, não posso considerar que o seu texto esteja “bem escrito”.
Os conceitos de “esquerda” e “direita” associados à Política, tiveram a sua génese na Revolução Francesa de 1789. No parlamento que se formou posteriormente, os revolucionários burgueses triunfantes sentavam-se na ala esquerda da sala e os monárquicos, apologistas do antigo regime, na ala direita, para não se misturarem.
Desde então a “esquerda” é reconhecida como “progressista”, adepta da mudança, e a “direita” é associada ao conservadorismo, aos valores antigos. É esse o verdadeiro significado dos dois conceitos.
Bem, qualquer pessoa com capacidade de raciocínio superior ao de uma galinha sabe que nem tudo o que é novo é bom e nem tudo o que é antigo é mau. Foram os valores ancestrais que permitiram à Humanidade chegar aos dias de hoje mantendo alguma coesão social.
Durante algum tempo, os movimentos socialistas de alguma forma apropriaram-se da designação de “esquerda”. Mas isso acabou com o desmantelamento da antiga União Soviética, e com a trementa confusão que esse facto veio a desencadear nas organizações de trabalhadores em todo o mundo.
A direita usou então toda a sua enorme máquina de propaganda para destruir a verdadeira esquerda e substituí-la por uma nova “esquerda” que de “esquerda” tem apenas o nome. Na verdade, a direita afeta ao Grande Capital devorou a esquerda e, ao regurgitá-la novamente, transformou-a numa coisa sem sentido e numa nova ferramenta de controle das massas.
Essa é a natureza do movimento Woke. Os direitos das mulheres, o respeito para com os desvios sexuais, o antirracismo, o acolhimento de imigrantes, a proteção da natureza, são ideias associadas ao progressismo, correto? E foi assim que o neoliberalismo (que é na sua essência uma forma de fascismo) de repente se apropriou de praticamente todos os ideais da esquerda tradicional, corrompendo-os pela raiz e dando-lhes um sentido e uma utilidade aberrantes.
É assim que partidos que na sua essência e linhas programáticas são na verdade de extrema direita (o neoliberalismo é isso, basta ver a semelhança com a ideologia diretora do antigo partido “dos fascios” de Mussolini) apresentam-se junto das populações como sendo “de esquerda”. O articulista, talvez por não possuir uma base ideológica sustentada, parece não ver a diferença.
Quanto ao crescimento generalizado dos partidos de “extrema direita” na Europa, ele tem de ser visto com algum cuidado. No caso de Portugal, por exemplo, o crescimento do CHEGA nas últimas eleições legislativas corresponde quase exatamente à redução do absentismo verificada. Isto é, os eleitores que votaram massivamente neste partido eram pessoas que já não votavam faz algum tempo, pessoas profundamente desiludidas com a política tradicional que se deixaram levar pela linguagem radical desse partido porque desejam uma rotura completa com o sistema. Isso não deixa de ser bom, ainda que o partido em questão seja execrável. Mas ele não ficará onde está para sempre.
É preciso entender também que hoje praticamente todos os partidos que defendem o regresso aos valores tradicionais são imediatamente catalogados como “fascistas” e de extrema direita, muito embora esses valores tivessem sido defendidos por praticamente todas as forças políticas apenas há umas décadas atrás. A verdadeira direita aposta na destruição de todo o tecido social de forma a transformar as populações numa massa amorfa e acéfala para melhor as dominar. E essa é a verdadeira questão.
Da mesma forma que Zelensky procura transmitir para o mundo a ideia de que o povo ucraniano está todo unido na defesa da sua pátria contra os russos (o que não é verdade, como se pode constatar por exemplo nos arraiais de pancadaria que se geram espontaneamente de cada vez que os agentes mobilizadores tentam levar um sujeito “caçado” nas ruas) também o articulista parece não ter dúvidas de que o chamado “Sul Global” está solidamente unido a favor da multipolaridade e contra o Ocidente Global. E isso também não é verdade.
Basta ver o que se passou recentemente na Argentina, que estava prestes a beneficiar de um resgate económico no seio do BRICS e onde alguns milhões de imbecis deitaram tudo a perder. O próprio Brasil, dividido entre uma pequena maioria de esquerda e uma direita revanchista apoiada por umas Forças Armadas com fidelidade canina aos EUA, não está tão seguro assim. Na África do Sul vemos que o ANC está a perder apoio popular e partidos pró EUA e pró sionismo estão a crescer. Há um longo caminho a percorrer até à multipolaridade. E ele está repleto de pedras, buracos e armadilhas diversas.
Infelizmente é assim.
Muito bem escrito de fato. Me permito um humilde suplemento:
Por essas e outras que precisamos de um Jornalista iraniano para colocar na devida perspectiva a conjuntura política mexicana, onde a esquerda (real) emplacou uma vitoria acachapante e agora controla 2/3 de tudo, desde as casas legislativas ao colegio de governadores (https://sakerlatam.blog/no-mexico-o-ocidente-enfrenta-seu-maior-medo-supermaiorias-de-esquerda/). O foco da (ex-)esquerda nativa, aspirantes eternos à classe média e cidadania européia, permanece a derrota mais do que prevista de Macron e o pseudofato do avanço da extrema direita na Europa…
Bem, ele provavelmente vai ter que renunciar, será que veremos alguns conterraneos cortando os pulsos ?
Sim. Tentarão cortar os pulsos com facas cegas.
A esquerda e os progressistas classe média média dormem em berço esplêndido.
A esquerda e os progressistas brasileiros vestiram seus papéis de classe média média. Nunca mais sairão dessa areia movediça em que se meteram desde 2013. Foram conduzidos, manipulados e cuspidos para fora da luta, nada mais que uma multidão de pessoas vagando com suas contas mensais e sonhos recheados de roncos. Importante falar das universidades e sua mudez covarde em não falar de Gaza; dos intelectuais submissos feitos francês insubmissos; dos artistas em suas penthouses e ingressos caros pra xuxu. A vida mudou nesse planeta Terra e muitos ainda acreditam que nasceram virados pra lua. Estamos caminhando pra um novo momento histórico que realmente começou em 7/10/24 com o nascimento da geração G, nossa geração Gaza.