Andrew Korybko – 4 de julho de 2022 – [Gentilmente selecionado, traduzido e enviado por Z.T.]
A Rússia certamente tem razão com relação ao Brasil e à Índia merecerem assentos permanentes no Conselho de Segurança das Nações Unidas, mas é impensável esperar que os três membros permanentes do Bilhão de Ouro concordem com isso, sem mencionar que possivelmente também concedem o mesmo privilégio a seus aliados alemães e japoneses.
O Embaixador russo na China Andrey Denisov reafirmou o apoio de seu país aos assentos permanentes que o Brasil e a Índia solicitaram no CSNU, mas confirmou que Moscou continua se opondo aos da Alemanha e do Japão. Os dois primeiros “aumentariam a participação proporcional das nações africanas, asiáticas e latino-americanas para que o Conselho de Segurança da ONU pudesse refletir as aspirações das pessoas ao redor do mundo e ser um órgão mais democrático”, enquanto o segundo par “tornaria o desequilíbrio [a favor do Ocidente liderado pelos EUA no Conselho de Segurança da ONU] ainda mais marcante”.
Esta é uma postura pragmática que se alinha com a transição sistêmica global para a multipolaridade. “A Grande Bifurcação” causada pela Nova Guerra Fria resultou na divisão sistêmica entre o Bilhão de Ouro do Ocidente liderado pelos EUA e o Sul Global liderado pelos BRICS; a visão ideológica/mundialista entre os liberais-globalistas unipolares (ULGs) e os conservadores-soberanos multipolares (MCS); e a divisão tática entre o establishment e os populistas (a maioria relevante no sentido orgânico com respeito ao Bilhão de Ouro, mas potencialmente armamentável por eles contra o Sul Global).
O Brasil e a Índia são Grandes Potências cuja liderança nos BRICS – especialmente o papel da Índia como parte de seu núcleo Rússia-Índia-China (RIC) – fazem deles os motores da dimensão econômico-financeira da emergente Ordem Mundial Multipolar. Eles também praticam uma política de neutralidade de princípios em relação ao conflito ucraniano, o que os torna líderes entre seus colegas do Sul Global em virtude de seu tamanho e influência crescente. Sua contínua falta de um assento permanente no CSNU é injusta porque priva suas regiões – América Latina e Sul da Ásia – de uma representação adequada.
O Brasil foi arrogantemente considerado como o “quintal” dos EUA por séculos, mas provou sua autonomia estratégica desde o início do século, enquanto a Índia está entre as regiões mais populosas do mundo. O Sul da Ásia também está situado no centro do Hemisfério Oriental, onde os processos multipolares do mundo estão convergindo cada vez mais, o que torna seu significado estratégico global ainda maior do que poderia parecer à primeira vista. Dito isto, a reforma do CSNU não é possível sem o acordo de todos os membros permanentes, o que significa que os EUA, o Reino Unido e a França poderiam facilmente obstruir isto.
Esses três representantes do Bilhão de Ouro têm um profundo interesse em perpetuar o desequilíbrio entre seu bloco e o Sul Global. Para tanto, é irrealista esperar que eles aprovem o Brasil e a Índia como membros permanentes, pelo menos não sem também conceder tais cadeiras à Alemanha e ao Japão ao mesmo tempo. Na ausência deste compromisso potencial, que o Bilhão de Ouro de qualquer modo não apoiaria, estes dois membros dos BRICS provavelmente nunca receberão o status político oficial nas Relações Internacionais que merecem.
Em tal cenário, a ONU como um todo sofreria, pois potências emergentes como essas duas e outras teriam menos fé nesta plataforma global, até porque o CSNU teria provado ter sido paralisado pela bifurcação sistêmica da Nova Guerra Fria, tornando-se praticamente irrelevante ao se recusar a admitir esses dois líderes multipolares como membros permanentes. Isso, por sua vez, poderia acelerar os processos de regionalização através dos quais o Brasil e a Índia se afirmam em primeiro lugar e principalmente através das plataformas de integração regional que lideram, que são o MERCOSUL e a SAARC, respectivamente.
A partir daí, estes grupos podem então interagir independentemente com seus colegas do Sul Global através do que o estudioso russo Yaroslav Lissovolik prevê como BEAMS. Seu editorial na CGTN no final do mês passado descreveu este conceito como “a agregação dos blocos de integração regional de todos os cinco membros dos BRICS – representados pelas plataformas ‘BEAMS’ que consistem na Iniciativa da Baía de Bengala para a Cooperação Técnica e Econômica Multissetorial, União Econômica Eurásia (EAEU), a Área de Livre Comércio ASEAN-China, o Mercosul e a União Aduaneira da África do Sul”.
Verdade seja dita, este modelo alternativo de globalização, de orientação geoeconômica, poderia, em última análise, facilitar a emergente Ordem Mundial Multipolar muito mais, em sentido prático, do que a concessão de assentos permanentes do CSNU ao Brasil e à Índia, em grande parte simbólica, embora esse resultado exacerbasse a bifurcação sistêmica da Nova Guerra Fria e provavelmente impossibilitasse o retorno à sua natureza anteriormente globalizada. Isso, entretanto, não é necessariamente uma coisa ruim, embora ainda deva ser mantido em mente pelos analistas estratégicos ao longo das próximas décadas.
Considerando a visão compartilhada até agora nesta análise, a Rússia certamente tem razão com relação ao Brasil e à Índia merecerem assentos permanentes no Conselho de Segurança das Nações Unidas, mas é impensável esperar que os três membros permanentes do Bilhão de Ouro concordem com isso, sem mencionar que possivelmente também concedam o mesmo privilégio a seus aliados alemães e japoneses. Seja como for, a globalização geoeconômica alternativa poderia funcionar como uma solução viável para garantir que essas duas Grandes Potências possam exercer influência global proporcional ao seu papel na emergente Ordem Mundial Multipolar.
Fonte: https://oneworld.press/?module=articles&action=view&id=3048
Talvez melhor descartar a ONU de vez, e formar uma nova organizição mais representativa dos poderes economicos, militares, etc.